A Auditoria Ambiental e suas Aplicações

Toda atividade econômica gera impactos sobre os ecossistemas, seja pela demanda sobre os recursos naturais (água, solo e biodiversidade), seja pelo aumento das várias formas de poluição ou pelo surgimento dos passivos ambientais.

Anteriormente os grandes projetos industriais eram executados sob o argumento da necessidade irrefreável de priorizar o desenvolvimento econômico, objetivando a geração de riquezas, emprego, tributos, etc.

O meio ambiente constituía um parâmetro de menor relevância, ignorado como se os eventuais impactos ambientais não representassem riscos.

Assim, o meio ambiente foi considerado durante décadas como um parâmetro menor no processo de análise e decisão empresarial, propiciando que projetos inviáveis pudessem ser implantados e operados impunemente.

Estas distorções demonstram a necessidade de que a análise de viabilidade econômica considere a componente ambiental sob o risco de superestimar as reais potencialidades do projeto.

Em outras palavras, se não analisarmos os componentes ambientais e seus desdobramentos poderemos contribuir para a aprovação de projetos inviáveis já em sua origem.

A auditoria ambiental surgiu nos EUA durante a década de 70, tornando-se uma ferramenta de gerenciamento para identificar antecipadamente os problemas que as empresas poderiam provocar com sua operação.

Inicialmente as empresas americanas pretendiam utilizar a auditoria ambiental com os seguintes objetivos:

  • Garantir que sua produção estava em conformidade com a legislação ambiental;
  • Reduzir os custos decorrentes de reparos/adequação em sua estrutura física;
  • Reduzir o absenteísmo e o tratamento de saúde de seus funcionários;
  •  Definir as alternativas tecnológicas mais adequadas para minimizar seus impactos ambientais, tais como a instalação de filtros, substituição de máquinas e/ou matéria prima, etc.;
  • Obter uma imagem positiva da empresa e de seus produtos perante um mercado consumidor cada vez mais exigente e consciente das questões ambientais.

A normatização em nível internacional foi alcançada apenas na década de 90 com o desenvolvimento da Série ISO 14.000, normas desenvolvidas em caráter voluntário, sem instrumentos legais que forcem sua adoção.

No Brasil as normas da Série ISO 14.000 foram adotadas após sua tradução e publicação, a cargo da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), em 1996, sendo que a auditoria ambiental está contemplada nas normas NBR ISO 14.010, 14.011 e 14.012, conforme a tabela a seguir.

Tabela n.º 01:  Normas de Auditoria Ambiental da ABNT

Norma Conteúdo
NBR ISO   14.010 Estabelece   os princípios gerais aplicáveis a todos os tipos de auditoria ambiental.  Essa norma contém, também, definições   acerca de termos técnicos normalmente empregados nas auditorias ambientais.
NBR ISO   14.011 Esta   norma está relacionada especificamente   com as auditorias de Sistema de Gestão Ambiental (SGA).
NBR ISO   14.012 Critérios   de qualificação para auditores ambientais.

Fonte: ABNT, 1994.

 As Aplicações Mais Comuns da Auditoria Ambiental

Conforme mencionamos anteriormente, a auditoria ambiental é um instrumento de análise que pode ser utilizado de diversas formas, dependendo dos objetivos a serem alcançados, tais como:

a) Análise da Conformidade Legal

A auditoria ambiental voltada à conformidade legal procura verificar se uma determinada empresa observa as condicionantes e limites ambientais impostos pela legislação.

As empresas necessitam de uma orientação no sentido de atender plenamente o disposto na legislação ambiental, evitando a aplicação de multas e outras sanções legais como a paralisação temporária das atividades ou mesmo o seu fechamento definitivo.

Por outro lado, uma empresa em conformidade com os ditames legais pode dar início a um processo de certificação ambiental com vistas à obtenção de um “selo verde” dos seus produtos para, consequentemente, conquistar outros mercados consumidores.

Neste tipo de utilização da auditoria ambiental, procura-se observar, dentre outros aspectos:

  • Se os padrões de lançamento de resíduos e de efluentes na atmosfera e nos corpos hídricos estão dentro dos limites especificados pela legislação;
  • Se a empresa vem cumprindo as condicionantes impostas pelo órgão ambiental no processo de licenciamento;
  • Se a empresa auditada cumpre as normas legais no que tange ao acondicionamento, transporte, tratamento e disposição final de resíduos, etc.

b) Avaliação de Risco Ambiental

Quando uma empresa decide construir, ampliar ou reformar sua planta industrial, é necessário que o processo de decisão considere os aspectos da legislação ambiental, em especial no que concerne ao risco ambiental decorrente de possíveis acidentes.

A empresa poderia, para sua maior segurança, contratar uma empresa especializada em auditorias ambientais de forma a identificar todos os pontos vulneráveis de seu processo produtivo, desde a aquisição da matéria-prima até a logística de venda do seu produto final, passando pelos processos industriais e resíduos gerados.

A auditoria poderia verificar, igualmente, quais os resíduos formados no processo produtivo e apontar a melhor alternativa tecnológica para sua eliminação.

Uma vez de posse desses dados técnicos é possível a tomada de decisão acerca da real viabilidade do empreendimento.

c.  Apuração de Responsabilidade em Acidentes

A legislação ambiental no Brasil determina que, em casos de acidentes, o agente responsável seja multado pela ocorrência do impacto ambiental e, ainda, promova a reparação dos danos causados.

A auditoria ambiental poderia ser utilizada para identificar o responsável pelo acidente, relacionar os danos ambientais decorrentes e valorá-los em termos financeiros, de forma a amparar ações na esfera judicial para ressarcimento dos danos.

Veja o exemplo de um vazamento de petróleo que atinge uma área turística ou com grande potencial pesqueiro.

De acordo com a legislação ambiental brasileira a empresa responsável pelo vazamento deverá ser multada pelo órgão ambiental competente, além de ser obrigada a reparar ou compensar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros.

Como podemos observar, a reparação dos danos decorrentes de um acidente envolve estudos profundos sobre o meio ambiente afetado e suas relações com os demais ecossistemas, além da aplicação de técnicas para valoração econômica dos impactos ambientais.

Essas ações podem ser desenvolvidas no âmbito de uma auditoria ambiental.

d. Identificação de Passivos Ambientais

 Um passivo ambiental representa o valor financeiro que determinada empresa deverá assumir futuramente em razão das alterações que o seu processo produtivo impõe ao meio ambiente.

Embora estejam comumente associados a acidentes ou danos que afetam o meio ambiente os passivos ambientais possuem diversas outras origens, tais como:

  • Custos associados às ações para reparação de danos ambientais;
  • Custos de indenizações a terceiros em decorrência de acidentes ambientais;
  • Multas aplicadas por órgãos ambientais em decorrência de falhas e inconsistências apresentadas pela empresa e sua atividade produtiva;
  • Tanques de combustível deteriorados em postos de serviço;
  • Instalações industriais desativadas ou abandonadas;
  • Resíduos de processos industriais lançados sem controle na atmosfera, nos corpos hídricos e no solo;
  • Produtos descartados ao final de sua vida útil sem que sejam adotadas medidas de proteção adequada (pneus, baterias automotivas, computadores e seus acessórios, baterias de telefones celulares e outros);
  • Lixões a céu aberto;
  • Solo contaminado pelo uso de agrotóxicos;
  • Manutenção de equipes ou departamentos voltados para a questão ambiental;
  • Aquisição preventiva de equipamentos para controle da poluição; etc.

Os passivos ambientais representam custos que, em muitas oportunidades, são elevados o suficiente para inviabilizar processos de aquisição ou fusão entre empresas.

Caso a empresa compradora não observar a existência de passivos ambientais de responsabilidade da empresa a ser adquirida o risco associado à transação será potencializado, pois os custos destinados a conter ou remediar os passivos não estará contemplado nos cálculos iniciais.

Assim, a auditoria ambiental pode ser extremamente útil no sentido de permitir o cálculo mais justo e acurado de valores em processos de compra ou fusão de empresas, identificando:

  • A existência de passivos ambientais;
  • A natureza dos passivos identificados;
  • A responsabilidade pela eliminação dos passivos;
  • As tecnologias existentes para redução dos riscos associados aos passivos;
  • O custo financeiro para adoção das medidas preconizadas;
  • O período de tempo necessário para eliminar os passivos.

e.  Certificação Ambiental

A busca de novos mercados consumidores é uma necessidade imperiosa para as empresas em um mundo globalizado e o meio ambiente é uma das condicionantes que vêem sendo consideradas na conquista de novos mercados, dada a exigência dos consumidores.

Veja o caso de uma empresa de móveis que utiliza o mogno da Amazônia de forma predatória ou não sustentável.

Ao tentar vender seus produtos em países mais desenvolvidos  onde a sociedade possui considerável nível de conscientização, a empresa enfrentará barreiras legais associadas ao meio ambiente, sendo proibida de vender.

Os consumidores da Europa, EUA e Japão demandam produtos elaborados de forma racional e ambientalmente sustentável e, em futuro próximo, esse comportamento deverá ser ampliado para um leque maior de produtos, forçando os produtores e exportadores a adotar novos processos produtivos que garantam a sustentabilidade ambiental de sua produção.

Mas qual é a garantia ou certeza que um consumidor inglês ou alemão pode ter de que a sua nova mesa de mogno foi fabricada com madeira obtida em cultivos sustentados?  Ele não corre o risco de “comprar gato por lebre” ?

A garantia está no processo de Certificação Ambiental, onde as empresas produtoras se submetem a um rigoroso exame em suas instalações, processos industriais e fornecedores de matéria-prima de forma a atestar que o seu produto apresenta sustentabilidade.

Uma vez de posse desse Certificado Ambiental, conhecido também como “selo verde”, a empresa garante o seu acesso a um mercado consumidor mais exigente e que está disposto a pagar um sobrepreço pela qualidade do produto.

A Certificação Ambiental é obtida mediante o atendimento pela empresa de uma série de condicionantes e etapas que atestarão a qualidade e sustentabilidade do processo produtivo e sua adequabilidade aos ditames legais.

 Isso envolve, obviamente, um processo semelhante ao de uma auditoria ambiental destinada a verificar os procedimentos da empresa face à legislação ambiental e, também, se a empresa tem condições de comprovar a utilização de um manejo sustentável dos recursos naturais à disposição no seu parque industrial.

A citada verificação é continuada uma vez que as empresas poderiam agir de má fé e ajustar seus processos apenas momentaneamente para receber sua certificação, voltando ao padrão anterior.

 Assim, as empresas que já obtiveram o seu Certificado Ambiental ou “selo verde” são submetidas posteriormente à sucessivas auditorias para atestar a manutenção dos padrões exigidos pela legislação e pelo mercado consumidor, o que garante a perpetuação das práticas e políticas ambientais sustentáveis ao longo dos anos.

marceloquintiere@gmail.com

MQuintiere@twitter.com

Deixe um comentário