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Gestão de Resíduos em Brasília: O Vidro

Em setembro de 2015 tive a oportunidade de manter uma breve discussão técnica com o ex-superintendente do Consórcio Público de Manejo dos Resíduos Sólidos e das Águas Pluviais da Região Integrada do Distrito Federal e Goiás (CORSAP) acerca do Aterro Sanitário de Brasília.

A questão central era o prazo previsto para a entrega da obra.

Dizia o superintendente que a mesma seria entregue em fevereiro de 2016, enquanto eu sustentava, na condição de engenheiro e auditor do TCU, que o prazo real seria bem mais dilatado.

De fato, a obra foi entregue logo no início do ano, mas apenas no exercício de 2017. Devemos considerar que o atraso é muito superior a apenas um ano, uma vez que a obra já era uma necessidade desde a década de 1990.

Hoje temos um aterro sanitário que, segundo dizem, é capaz de receber 25% dos rejeitos do Distrito Federal.

Ainda é muito pouco em termos do volume total de resíduos produzidos, mas podemos esperar novas ampliações deste aterro ou mesmo novas unidades no Distrito Federal.

A questão é o tempo que teremos de esperar em função das conhecidas idas e vindas da gestão pública do DF.

Recentemente vi, com muita surpresa, a manifestação da Presidente do Serviço de Limpeza Urbana (SLU) no sentido de que a entidade não mais realizaria a coleta de vidro no DF.

A justificativa está associada ao fato de que o vidro não possui viabilidade econômica para ser reaproveitado nas condições do DF. Vejamos a matéria veiculada pelo Jornal de Brasília em 5/6/2017:

      “O problema com a reciclagem do vidro não é exclusivo do DF. No Brasil, poucas cidades conseguem fazer o serviço porque o número de fábricas que aproveitam o vidro é pequeno. É uma matéria-prima com valor baixo, o que torna inviável economicamente”, explica Kátia Campos, presidente do Serviço de Limpeza Urbana (SLU).   De acordo com a gestora, recolher o vidro pela coleta seletiva provoca gasto duplo: “O custo da coleta seletiva é por peso e o vidro pesa muito e vira rejeito. No fim das contas, temos que pagar por essa coleta e, depois, ainda arcar com a entrega nos aterros”. Além disso, são registrados cem acidentes por ano na coleta de lixo”.

             As cooperativas também afirmam que a coleta e reciclagem do vidro é um serviço inviável. Na mesma matéria elaborada pelo Jornal de Brasília o presidente da cooperativa, Cleusimar Andrade, destaca que o descarte de vidro no DF é um problema, mas a reciclagem ainda é inviável.

De acordo com Andrade, a tonelada de vidro vale R$ 140,00, mas o transporte custa R$ 160,00. “Nenhuma cooperativa quer trabalhar com vidro porque todo mundo sai no prejuízo”.

Não há empresa na capital que recicle o vidro, embora nossa produção de resíduos no DF seja muito expressiva, inclusive com a existência de empresas de bebidas de grande porte.

Assim, as garrafas, potes e cacos são dispensados e acabam encaminhados ao aterro sanitário junto com outros materiais classificados com rejeitos.

De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), estabelecida pela Lei n.º 12.305/2010, o lixo que produzimos passou a ser dividido em dois grandes grupos: resíduos e rejeitos.

Os resíduos são componentes recicláveis que, a princípio, deveriam ser coletados e encaminhados aos processos de reciclagem, retornando aos ciclos produtivos, de forma a reduzir os custos das indústrias produtoras com a aquisição da matéria prima. Aqui se enquadram as latinhas de alumínio, metais, VIDRO, equipamentos eletroeletrônicos, etc.

Já os rejeitos são todos aqueles materiais que não oferecem mais nenhuma possibilidade de serem reciclados. O destino desses materiais ou componentes é o aterro sanitário ou processos de queima para produção de energia. Aqui se enquadram restos de poda, matéria orgânica produzida em restaurantes e domicílios, etc.

A questão é que o vidro é completamente reaproveitável, mas, para os responsáveis pela gestão dos resíduos no Distrito Federal é considerado rejeito. Isso é como esconder o sol com a peneira.

Bem…o vidro é um componente reciclável e deveria ser encaminhado aos processos de reciclagem, conforme determina a PNRS.

O Jornal de Brasília destacou essa questão em sua matéria:

          “O vidro precisa de quatro mil anos para se decompor e são necessários milhares de quilos de areia para ser produzido. Em contrapartida, é um material 100% reciclável e gasta menos energia e água no processo, além de emitir uma quantidade reduzida de poluentes. Em um mundo ideal, todo o conteúdo seria reaproveitado.”

Como poderíamos solucionar essa questão?

Pela Lei dos Grandes Geradores de Resíduos Sólidos, aprovada pela Câmara Legislativa do Distrito Federal em fevereiro do ano passado, o reaproveitamento e a reciclagem do vidro não são de responsabilidade do poder público.

De acordo com o SLU, a viabilização do aproveitamento é responsabilidade da indústria de vidro. “Os fabricantes são responsáveis pelo retorno do vidro para a indústria. O poder público, ao fazer esse trabalho, comete improbidade administrativa se não for paga pelo serviço”, argumenta Kátia Campos.

Discordo desse argumento, uma vez que a PNRS estabelece a Responsabilidade Compartilhada entre todos os atores (governo, produtores, associações de catadores, etc.) pela gestão dos resíduos, inclusive no que toca à coleta seletiva e destinação final.

Não há que se falar em dividir as tarefas e responsabilidades, pois isso é contrário ao espírito que norteia a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Todos somos parte do problema e, portanto, somos obrigados a encontrar soluções eficazes e eficientes.

A responsabilidade das indústrias produtoras de vidro está vinculada à denominada Logística Reversa, também uma outra imposição da PNRS, que estabelece a obrigatoriedade de mobilizar toda uma cadeia produtiva e de distribuição, possibilitando que o bem inservível (celulares obsoletos, lâmpadas de mercúrio, pneus, etc.) saiam das mãos dos consumidores para, por meio de uma cadeia de logística, voltar às indústrias nas que foram produzidos.

Note que a cadeia de logística que vai amparar a Logística Reversa deve ser fruto de um acordo setorial com a presença de indústrias, governo, associações de catadores, indústrias de reciclagem, e muitos outros atores.

Em outras palavras, o governo é parte essencial no estabelecimento de uma política de implementação da Logística Reversa.  Não há como escapar desta responsabilidade legal.

Mas voltamos ao ponto: como solucionar essa questão?

Penso que o correto mesmo seria atrair indústrias de reciclagem do vidro para aproveitamento do resíduo vidro (totalmente reciclável) produzido na região do DF e entorno, a denominada RIDE.  No mesmo sentido pensa a doutora Valéria Gentil Almeida em sua manifestação ao Jornal de Brasília:

       “É fundamental que as indústrias venham para o DF para conseguirmos reciclar e minimizar os custos com transporte. Para isso, é preciso pensar nos incentivos do governo”, considera Valéria Gentil Almeida, doutora e mestra em Desenvolvimento Sustentável e professora da UnB. De acordo com a especialista, hoje realmente é inviável economicamente reciclar o vidro. “É custoso. A cadeia produtiva do vidro é muito particular. Por mais que se diga que consegue agregar valor, a catação é complicada e envolve riscos, inclusive de saúde”,

A esse respeito destaco que o governo aprovou, no ano passado, um decreto que reduz o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) de 12% para 1% para a indústrias da reciclagem. Isso para facilitar, ampliar e atrair o mercado para a nossa capital.

É uma medida interessante, mas a renúncia de receita deve ter seus impactos econômicos estimados por três anos, além de ser necessária a apresentação dos mecanismos de compensação para esse gasto (aumento de receita de outros impostos ou redução de despesas).

Estas imposições se encontram na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e o seu descumprimento é coisa séria. Que o diga a ex-presidente Dilma e suas pedaladas fiscais.

Vamos acompanhar e observar se a política do DF, tão lenta e tortuosa, possa solucionar a questão a curto prazo.

Passivos Ambientais: O Risco Nosso de Cada Dia

No dia 5 de novembro de 2015 o pequeno povoado de Bento Rodrigues, um subdistrito do município de Mariana (MG), teve sua longa história de 317 anos profundamente alterada, com a morte de aproximadamente 20 pessoas e a destruição, em dimensões inacreditáveis, de toda a sua infraestrutura, além do comprometimento dos ecossistemas ao longo de centenas de quilômetros.

A tragédia não ocorreu em razão da queda de um meteorito errante, nem pela ocorrência de um terremoto devastador ou outro fenômeno natural imprevisível.

Ao contrário…

Foi construída por mãos humanas ao longo de décadas e carrega a combinação letal de ganância, arrogância, imprudência, impunidade e incapacidade gerencial, tanto da empresa privada responsável, quanto dos órgãos e gestores públicos envolvidos.

A origem da tragédia, já considerada por muitos como o maior acidente ambiental do Brasil, está associada ao rompimento de uma das barragens de resíduos pertencentes à Mineradora Samarco, uma empresa de grande porte controlada por duas gigantes globais do setor da mineração: a Companhia Vale do Rio Doce, brasileira, e a BHP Billinton, controlada por capital anglo-australiano.

As barragens de resíduos, sejam oriundas de projetos industriais ou decorrentes da exploração mineral, são exemplos de “passivos ambientais”, um tema ainda pouco explorado no Brasil, que, entretanto, vem conquistando a atenção dos profissionais de diversas áreas do conhecimento, inclusive advogados, em razão da severidade dos impactos gerados e do crescimento de casos similares em todo o mundo.

Esse tipo de ocorrência não constitui, infelizmente, um caso isolado no Brasil. A título de exemplo destacamos alguns casos ilustrativos de passivos ambientais:

  • O acidente de Cataguases (MG) em 2003;
  • O deslizamento do Morro do Bumba em Niterói (RJ), ocasionando a morte de 48 pessoas e dezenas de feridos em 2010;
  • Rompimento de barragem de resíduos em Itabirito (MG) em 2014;
  • O Lixão da Alemoa no Porto de Santos (SP);
  • O aterro Industrial de Ingá (RJ);
  • Os milhares de lixões distribuídos por nossos municípios, e outros.

Os passivos ambientais existem aos milhares em nosso país e, na grande maioria dos casos, ainda não estão adequadamente identificados e mapeados pelos órgãos ambientais dos estados e municípios. Estamos diante de uma ameaça significativa que, a depender dos produtos tóxicos armazenados, poderá ocasionar uma tragédia sem precedentes.

Obviamente não constitui nosso objetivo demonizar a atividade mineradora no Brasil, mas os riscos crescentes, inclusive no que tange ao surgimento de novos passivos ambientais, nos obrigam a uma reflexão ponderada e imparcial acerca do problema e da necessidade de buscarmos soluções equilibradas.

Não é possível acreditar cegamente no falso dilema entre o estímulo à produção econômica e a imperiosa obrigação moral de proteção ao meio ambiente.

As soluções existem, sendo necessário o desenvolvimento de análises técnicas e políticas das complexas questões envolvidas de modo a criar uma proposta factível que permita o equilíbrio entre o crescimento econômico e a proteção ambiental.

Este documento tem como objetivo a análise dos riscos vinculados à atividade mineradora, e destacar aspectos relevantes que merecem maior atenção por parte dos órgãos públicos envolvidos.

1 – Os Possíveis Impactos da Mineração

Os diversos impactos associados à atividade mineradora podem ser didaticamente agrupados em três grandes dimensões: ambiental; social e econômica, descritas resumidamente a seguir:

  1. Impactos Ambientais
  • Supressão vegetal;
  • Comprometimento da biodiversidade;
  • Degradação da paisagem;
  • Aumento do ruído;
  • Extração excessiva de água (conflito de uso);
  • Remoção do solo e liberação de finos com alta toxidade;
  • Contaminação do solo, atmosfera, água superficial e subterrânea por metais pesados;
  • Formação de grandes passivos ambientais extremamente perigosos, tais como as barragens de rejeitos; e outros.
  1. Impactos Sociais
  • Alteração da estrutura social da população;
  • Ação negativa sobre minorias étnicas (índios e quilombolas);
  • Aumento do fluxo migratório e inchaço urbano;
  • Maior incidência de doenças;
  • Sobrecarga dos serviços sociais.
  1. Impactos Econômicos
  • Elevação na concentração de renda;
  • Alteração dos modos de produção tradicionais;
  • Redução do potencial agrícola e pecuário nas áreas afetadas;
  • Impactos negativos na agroindústria;
  • Elevação nos custos de tratamento de doenças pelo SUS;
  • Especulação imobiliária, e outros.

2 – A Questão Específica dos Passivos Ambientais

As operações de mineração são responsáveis, ainda, pela formação de grandes passivos ambientais.

Em termos conceituais o passivo ambiental consiste em um valor monetário que procura expressar, ainda que sob a forma de estimativa, qual o gasto total que determinada empresa ou instituição deverá arcar no futuro em decorrência dos impactos ambientais gerados por sua atividade produtiva.

De acordo com o IBRACON – Instituto dos Auditores Independentes do Brasil, o passivo ambiental consiste no valor dos investimentos necessários para reparar toda a agressão que se pratica ou praticou contra o meio ambiente.

Para UEHARA, o passivo ambiental se constitui no dia-a-dia das operações, consistindo em contrapartida às alterações ambientais provocadas pelas atividades econômicas desempenhadas pelas empresas.

Assim, um passivo ambiental representa toda e qualquer obrigação destinada, única e exclusivamente, a promover investimentos em prol de ações relacionadas à extinção ou amenização dos danos causados ao meio ambiente, inclusive os valores direcionados a investimentos na área ambiental (MALAFAIA).

Os passivos ambientais existem aos milhares em nosso país e, na grande maioria dos casos, não são conhecidos pelos órgãos ambientais dos estados e municípios. O Brasil ainda não possui um mapeamento confiável capaz de identificar, monitorar e neutralizar os milhares de exemplos de passivos ambientais existentes em nosso território.

3 – As Barragens de Resíduos de Mineração: Ameaça Silenciosa 

Por que as mineradoras constroem grandes barragens de resíduos?

A regra imposta pela natureza consiste na combinação aleatória de minérios de valor econômico associados a grandes volumes de rocha estéril cujo valor não justifica sua exploração, fato que constitui um limitador da atividade mineradora.

Os empreendedores são obrigados a limitar seus custos com a logística de transporte, promovendo a separação do material estéril nas proximidades da mina, obtendo maior concentração do minério que se deseja explorar comercialmente.

Assim, o uso e manutenção das barragens de rejeitos, construídas para receber grandes volumes de material estéril, constitui um dos principais problemas da indústria mineradora.

As barragens de resíduos existem em todos os países, desenvolvidos ou não, e são utilizadas em diversos segmentos industriais, sendo frequente o surgimento de problemas associados ao seu rompimento e a consequente promoção de impactos ambientais bastante sérios.

Uma barragem de rejeitos constitui uma verdadeira bomba relógio prestes a explodir e o seu potencial de geração de danos decorre dos seguintes aspectos básicos: o volume de rejeitos estocados, a composição dos rejeitos e as ações voltadas à manutenção da estrutura das barragens.

O volume estocado na barragem é um elemento importante para a sua própria segurança estrutural, pois representa o peso que a estrutura física deverá suportar ao longo de anos.  Se houver incremento no volume estocado a barragem poderá ter sua estrutura física comprometida e o eventual rompimento gerará danos significativos, inicialmente pelo impacto físico de milhões de metros cúbicos de material e, depois, pela ação dos componentes nos ecossistemas.

A questão associada à composição dos resíduos é, também, fundamental para que possamos compreender os riscos vinculados às barragens de uma indústria mineradora.

Os resíduos estocados possuem composição distinta conforme o processo produtivo envolvido e a matéria prima utilizada.

Assim, não é raro encontrarmos barragens contendo resíduos bastante tóxicos, tais como metais pesados, cujos impactos sobre a saúde humana são evidentes, podendo provocar severas contaminações e o comprometimento da qualidade da água subterrânea, do solo agricultável e da biodiversidade por longos períodos de tempo. Além disso, os metais pesados possuem maior persistência no meio ambiente, sendo mais lenta a neutralização de seu potencial de risco.

A contaminação por metais pesados e demais produtos tóxicos tende a comprometer a denominada resiliência dos ecossistemas, ou seja, a sua capacidade natural de recuperar a condição de equilíbrio anterior.

A lama tóxica derivada da produção industrial é um exemplo comum de passivo ambiental, sendo necessário providenciar sua redução, neutralização do potencial de risco ou até mesmo a utilização econômica em outro processo produtivo de modo a minimizar seu potencial de risco.

4 – A Responsabilização pelo Acidente

Uma vez identificados os diversos impactos socioeconômicos e ambientais decorrentes do rompimento da barragem pertencente à empresa Samarco, cumpre-nos observar aspectos relevantes que poderão nortear a responsabilização da mineradora, de seus gestores e, ainda, dos órgãos governamentais envolvidos.

Em uma síntese bastante apertada, podemos resumir os impactos ocasionados da seguinte forma:

  1. Morte de aproximadamente vinte pessoas;
  2. Destruição do patrimônio de terceiros;
  3. Destruição de patrimônio histórico de caráter religioso;
  4. Comprometimento dos recursos hídricos;
  5. Interrupção da captação de água pelos municípios, afetando centenas de milhares de pessoas;
  6. Lucro cessante de empresas que foram impedidas de captar água para seus processos produtivos;
  7. Comprometimento da biodiversidade local;
  8. Destruição de mata ciliar;
  9. Derramamento de enorme volume de lama proveniente da mineração cuja composição apresenta concentração de metais pesados;
  10. Danos à paisagem natural;
  11. Comprometimento da resiliência dos ecossistemas afetados.

Evidentemente há que se considerar que o supracitado conjunto de impactos decorrentes do acidente colide frontalmente com o disposto em nossa Constituição Federal, em especial no que tange à manutenção e defesa do meio ambiente, enquanto bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.” 

De acordo com nossa legislação em vigor a ocorrência de um dano ambiental significativo poderá impor aos responsáveis a aplicação de sanções nas esferas Administrativa, Cível e Penal.

Quanto ao âmbito administrativo temos a possibilidade da aplicação de multas e demais sanções pelos órgãos ambientais nas esferas federal, estadual e municipal, além da atuação de outros órgãos públicos eventualmente responsáveis pela fiscalização dos projetos.

 A definição quanto ao ente responsável pela aplicação das sanções costuma estar associada à origem do processo de licenciamento da empresa/projeto, bem como à jurisdição pelas áreas afetadas.

No que tange à esfera penal recorremos à Lei n.º 9.605/98, conhecida como a Lei dos Crimes Ambientais, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.

De acordo com o artigo 2º daquele dispositivo legal quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos na Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.

Há que se destacar que as pessoas jurídicas também poderão ser responsabilizadas administrativa, civil e penalmente, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade (art. 3º da Lei 9.605/98).

Em outras palavras, a responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato.

Outro aspecto importante a ser destacado é que a Lei dos Crimes Ambientais prevê a denominada desconsideração da pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.

A tabela a seguir procura identificar alguns dos principais enquadramentos penais e suas respectivas sanções previstas na Lei dos Crimes Ambientais em face do acidente decorrente do rompimento da barragem da empresa SAMARCO.

Tabela n.º 01: enquadramentos penais e suas respectivas sanções previstas na Lei dos Crimes Ambientais

ARTIGO TEXTO LEGAL PENA
 

 

 

Art. 33

Dos Crimes contra a Fauna

 

Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras:

 

 

 

Detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente.

 

Art. 48

Dos Crimes contra a Flora

 

Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação

 

 

Detenção, de seis meses a um ano, e multa.

 

 

 

Art. 50-A

 

Desmatar, explorar economicamente ou degradar floresta, plantada ou nativa, em terras de domínio público ou devolutas, sem autorização do órgão competente:   (Incluído pela Lei nº 11.284, de 2006)

 

 

Reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa.         (Incluído pela Lei nº 11.284, de 2006)

 

 

 

 

Art. 54

Da Poluição e outros Crimes Ambientais

 

 

 

 

Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:

 

 

 

Reclusão, de um a quatro anos, e multa.

 

 

 

 

 

§ 2º Se o crime:

 

I – tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;

III – causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;

IV – dificultar ou impedir o uso público das praias;

 

 

 

 

Reclusão, de um a cinco anos.

 

 

Art. 62

Dos Crimes contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural

 

Destruir, inutilizar ou deteriorar:

 

II – arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial:

 

 

 

 

Reclusão, de um a três anos, e multa

 

Art. 63.

Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida  

 

Reclusão, de um a três anos, e multa.

Na esfera Cível a questão é um pouco mais complexa, haja vista a necessidade de, uma vez ocorrido o dano ambiental, atribuir valores monetários aos diversos componentes naturais dos ecossistemas afetados (ex.: água, solo, biodiversidade, etc.), o que envolve um grau considerável de subjetividade.

Além do óbvio compromisso moral, ético e legal de indenizar as famílias dos trabalhadores mortos e demais contaminados, as empresas são ainda obrigadas a reparar os danos gerados ao meio ambiente.

Isto decorre do fato de que o Direito Ambiental no Brasil, assim como em outros países desenvolvidos, adota a Teoria Objetiva da Responsabilidade que, por sua vez, encontra amparo na conhecida Teoria do Risco Integral:

Quem recebe os lucros de uma atividade deve estar preparado para assumir os eventuais danos causados a terceiros”.

A Teoria Objetiva da Responsabilidade tem como elementos básicos o dano causado e a existência do denominado nexo de causalidade com determinada atividade produtiva, não sendo necessário, para efeito da aplicação de sanções na esfera administrativa, o desenvolvimento de provas ou elementos comprobatórios acerca da culpa do infrator, conforme se verifica nos seguintes dispositivos legais:

  1. Lei n.º 6.938/81 – PNMA Art. 14, § 1º:

“Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.

  1. CF/ 1988, Art. 225, § 3º:

“As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

  1. Código Civil de 2002 – Lei n.º 10.406/2002, Art. 927, § único

“Haverá a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Ou seja, não há necessidade de aferição de negligência, imprudência ou imperícia por parte do causador do dano para que exista o dever de indenizar, bastando que a ação/omissão realizada pelo infrator gere dano. Ademais, o dever de indenizar independe do caráter lícito do ato/omissão praticado pelo infrator.

5 – Conclusão

O acidente de Mariana representa mais um triste exemplo de passivo ambiental construído ao longo de décadas e suas consequências, extremamente graves, se farão sentir por muitos anos.

Infelizmente não representa uma ocorrência pontual regida pelo acaso. Ao contrário: constitui uma prova da combinação letal de ganância, arrogância, imprudência, impunidade e incapacidade gerencial, tanto da empresa privada responsável, quanto dos órgãos e gestores públicos envolvidos.

Os erros cometidos pela empresa, em especial no que concerne à ausência de um plano eficaz de contingência em caso de acidentes, bem como os erros associados às previsões da rota que seria assumida pela onda de resíduos retratam o descaso do setor privado e a incapacidade do setor público, notadamente o DNPM, em realizar as necessárias fiscalizações e controle sobre os empreendimentos de mineradoras no país.

A adoção, pela SAMARCO, de um sistema de alerta de acidente baseado simplesmente no uso de telefones ao invés da implantação de um sistema de sirenes e treinamentos prévios potencializou os danos gerados, em especial no que concerne à perda de vidas humanas.

A combinação desses fatores, associada à carga da barragem, à ausência de uma fiscalização mais eficaz pelos órgãos públicos responsáveis, bem como a construção de alteamentos da barragem a montante (uma técnica reconhecidamente mais barata e de maior risco) foi fatal para uma comunidade reconhecidamente carente, limitando o tempo de resposta e de reação das vítimas.

Enquanto houver espaço para teses controversas, tais como a ocorrência de terremotos, continuaremos a contar novos acidentes e mortes decorrentes dos passivos ambientais no Brasil.

Impactos Ambientais – CARVÃO

         Toda e qualquer atividade econômica possui estreita vinculação com o meio ambiente.

            A associação entre a atividade econômica e o meio ambiente pode ser observada nas seguintes dimensões:

  • Aumento da demanda sobre bens e serviços ambientais (ex.: água, solo, oceanos, biodiversidade, etc.);
  • Geração de resíduos e/ou processos poluentes (ex.: indústria de produtos químicos, resíduos da construção civil, etc.);
  • Produção de Passivos Ambientais que podem vir a comprometer o meio ambiente (ex.: barragens de resíduos químicos, tanques em postos de combustíveis, etc.).

          A minha intenção é elaborar uma análise acerca de alguns segmentos econômicos relevantes, destacando o processo econômico sob o ponto de vista ambiental, os impactos sobre o meio ambiente e as medidas corretivas que devemos adotar para minimizar os problemas detectados.

           Este artigo analisará os impactos ambientais associados ao uso do carvão mineral e vegetal em nossos processos econômicos.

          A geração de energia é um dos principais desafios do mundo moderno e mobiliza complexas engrenagens vinculadas às dimensões social, econômica, política, tecnológica e ambiental.

        A oferta de energia garante o crescimento socioeconômico dos países e melhores condições de vida para suas populações.

         A partir de um fornecimento seguro de energia há maior possibilidade de gerarmos empregos, elevação da renda, dinamização da economia local, maior arrecadação de tributos e a qualificação da mão de obra.

         Assim, cada país busca ampliar a sua disponibilidade de energia de modo a estimular a industrialização, utilizando o mix de alternativas ou fontes que seja mais adequado à realidade econômica.

        A definição do mix mais racional das fontes de geração é um desafio considerável que envolve cifras gigantescas, além de complexas operações de logística para disponibilização da energia aos consumidores finais (indústrias, empresas e residências).

        Dentre as fontes de energia é possível destacar aquelas consideradas como não renováveis e as renováveis.

        As fontes não renováveis são compostas pelos combustíveis fósseis, tais como o carvão mineral, o petróleo, o gás natural, o xisto betuminoso, etc. Em geral essas alternativas energéticas representam elevados impactos ambientais vinculados à poluição atmosférica e o consequente aquecimento global.

        As fontes de energia renováveis são aquelas associadas à energia solar, eólica e hidrelétrica. Em geral são consideradas mais limpas e menos agressivas em termos dos seus impactos ambientais.

          No caso específico do carvão devemos considerar inicialmente que o Brasil possui a singularidade de explorar, comercializar e utilizar o carvão tanto de origem vegetal quanto aquele de origem mineral, sendo que cada um possui suas particularidades, conforme a tabela a seguir:

PARÂMETROS CARVÃO VEGETAL CARVÃO MINERAL
Renovável Sim Não
Principais impactos Socioambientais Desmatamento;

Redução da biodiversidade;

Problemas com trabalho insalubre e em condições análogas à escravidão;

Poluição atmosférica;

Contribuição para o efeito estufa (CO²)

Drenagem ácida;

Problemas de saúde (pneumoconiose);

Variação nas propriedades dos aquíferos;

Contaminação química;

Variação na morfologia dos terrenos;

Contribuição para o efeito estufa (CO², NOx, etc.);

Chuva ácida.

 Detalhamento – Carvão Mineral

           Dos diversos combustíveis produzidos e conservados pela natureza sob a forma fossilizada, em grandes profundidades ou perto da superfície. Acredita-se que o carvão mineral é o mais abundante.

           O carvão é proveniente de depósitos de restos de plantas e árvores, ou seja, uma vegetação pré-histórica que se acumulou em pântanos sob uma lâmina d’água há milhões de anos.

          Com o passar do tempo, estes depósitos foram cobertos por argilas e areias, ocorrendo provocando o aumento de temperatura e pressão sobre a matéria orgânica depositada, com a expulsão do oxigênio e o hidrogênio e a concentração do carbono (processo de carbonificação).

          O carvão mineral é um combustível fóssil natural extraído da terra através do processo de mineração, o que envolve uma série de questões sociais, econômicas e ambientais que devem ser acompanhadas e controladas pelas empresas mineradoras e pelos órgãos públicos.

         Existem quatro estágios na formação do carvão mineral: turfa, linhito, carvão (hulha) e antracito, os quais dependem de fatores como pressão e temperatura para sua formação.

Lavra e Beneficiamento do Carvão Mineral

          A lavra consiste no processo de extração do carvão, que pode ser realizado tanto a céu aberto quanto subterrâneo.

          A lavra a céu aberto ocorre quando a camada de carvão aflora à superfície, sendo feita a remoção da camada de estéril e a posterior extração da camada de carvão.

          A lavra subterrânea pode ser feita através de galerias de forma manual, semi-mecanizada ou mecanizada.

          O beneficiamento consiste numa série de processos que visam à redução da matéria inorgânica, tais como rocha (estéril) e impurezas, existente no carvão a fim de melhorar sua qualidade e assegurar a qualidade para aumentar sua potencialidade para o uso.

           O tratamento depende das propriedades do carvão e de seu uso pretendido, podendo exigir uma simples lavagem/moagem ou necessitar de processos mais complexos de tratamento.

 Principais Usos do carvão Mineral

Energia elétrica

             Atualmente, o principal uso da combustão direta do carvão é na geração de eletricidade, por meio de usinas termoelétricas. O Brasil vem desenvolvendo uma política de implantação de usinas termelétricas voltada à garantia do fornecimento firme de energia.

             Isso ocorreu após o denominado apagão de 2001 e, mais atualmente, em razão da crise hídrica que comprometeu a geração pelas usinas hidrelétricas.

            O carvão nacional, produzido nos Estados de Santa Catariana (10%) e Rio Grande do sul (85%), possui elevado teor de cinzas e enxofre, além de baixo poder calorífico, o que impõe sua substituição pelo carvão mineral importado de maior poder calorífico.

            Essa tecnologia está bem desenvolvida e é economicamente competitiva. Vale destacar que o carvão mineral não é o único combustível fóssil usado para gerar energia elétrica, concorrendo com o petróleo, gás natural, energia nuclear,

 Calor

            Diversas indústrias necessitam de calor em processos de produção, tais como a secagem de produtos, cerâmicas e fabricação de vidros. Estas atividades utilizam o carvão mineral na geração de calor.

 Siderurgia

           A siderurgia é um ramo da metalurgia especializado na elaboração dos produtos ferrosos: gusa (liga de ferro e carbono com alto teor de carbono), aço e ferros fundidos.

          O equipamento onde o processo de redução do ferro ocorre é chamado de Alto-forno, sua função é provocar a separação do ferro, Fe, do seu minério, Fe2O3.

          Assim, a indústria siderúrgica depende em larga escala do carvão mineral metalúrgico que representa uma grande parcela do custo final do aço produzido.

          O ferro gusa é o produto imediato da redução do minério de ferro pelo coque ou carvão na presença de calcáreo em um alto forno e sua elevada concentração de carbono faz com que seja um material quebradiço e sem grande uso direto.

Geralmente nos processos industriais o ferro gusa é considerado uma liga de ferro e carbono, contendo de 2,11 a 5,00 % de carbono, além de outros elementos residuais como silício, manganês, fósforo e enxofre.

O gusa produzido no alto-forno é vertido diretamente para formar lingotes que, então, serão usados para produzir ferro fundido e aço com a extração do carbono em excesso.

Gaseificação

           O termo gaseificação é usado para descrever as reações termoquímicas de um combustível sólido (carvão) com a finalidade de formar gases que podem ser usados como fonte de energia térmica e elétrica, além da síntese de produtos químicos muito importantes para diversas cadeias produtivas, tais como fertilizantes, amônia, lubrificantes, combustível para aviação, diesel, metanol, etc.

Problemas Ambientais do Carvão Mineral

 Drenagem Ácida

            A poluição hídrica causada pelas drenagens ácidas é provavelmente o impacto mais significativo das operações de mineração, beneficiamento e rebeneficiamento.

           As drenagens ácidas ocorrem em áreas nas quais o mineral a ser lavrado encontra-se sob a forma de sulfetos ou quando sulfetos estão associados às rochas encaixantes.

           Os resíduos de minas (estéreis e rejeitos provenientes do beneficiamento) ricos em sulfetos, ao ficarem expostos à água e ao ar, oxidam-se gerando acidez.

           Quando da avaliação da geração de drenagens ácidas, dois aspectos devem ser levados em conta. Primeiramente, o fato de que seus impactos não se restringem apenas à área minerada, podendo atingir corpos hídricos superficiais e subterrâneos distantes do empreendimento.

          Além disso, as reações químicas envolvidas no processo usualmente ocorrem durante anos após esgotado o depósito mineral. Alia-se a esses o fato de que a contaminação gerada inviabiliza o uso da água para fins recreativos, agrícolas e de consumo.

 Emissões de CO²

         Quando o derivado de carbono (C) é fóssil, como no caso do carvão, petróleo, xisto e gás natural, são lançadas à atmosfera quantidades de C que estavam imobilizadas, contribuindo para aumentar o inventário de CO2 no meio ambiente, ocasionando o aquecimento global e as consequentes mudanças climáticas.

 Chuva Ácida

           Como o carvão contém teores expressivos de enxofre, a sua queima provoca ainda o lançamento na atmosfera de dióxido de enxofre, um dos responsáveis pela chuva ácida, com graves problemas de poluição do meio ambiente.

  Detalhamento – Carvão Vegetal

          O Brasil ocupa o primeiro lugar na produção de carvão vegetal.

          O carvão vegetal é obtido a partir da queima ou carbonização de madeira, sendo utilizado como combustível de aquecedores, lareiras, churrasqueiras e fogões a lenha, além de abastecer alguns setores industriais, como as siderúrgicas.

         O carvão também é usado na medicina, nesse caso chamado de carvão ativado oriundo de determinadas madeiras de aspecto mole e não resinosas.

          No Brasil há relatos de uso de carvão vegetal por parte dos índios, esses realizavam a mistura da substância com gorduras de animais com finalidade de combater doenças como tumores e úlceras.

        O carvão também se destaca na condução de oxigênio e um eficiente disseminador de toxinas. Diante de várias indicações positivas do carvão, pode-se destacar o seu uso no tratamento de dores estomacais, mau hálito, aftas, gases intestinais, diarreias infecciosas, desinteira hepática e intoxicações.

        O estado de Minas Gerais é o maior produtor brasileiro de ferro e aço, responsável por 60% da produção doméstica. Tem 62 usinas de ferro-gusa que precisam de carvão vegetal.

          Aproximadamente 70% da produção nacional de carvão vegetal é feita por pequenos produtores. Com isto, as políticas públicas deverão promover e priorizar incentivos que facilitem o acesso deste grande contingente a estas inovações, tanto de processo quanto de equipamentos de melhor eficiência energética.

           Uma tendência sugerida é pela formação de associações ou cooperativas de pequenos produtores que possam organizar polos industriais visando viabilizar o uso das novas tecnologias que se mostrarem viáveis do ponto de vista técnico, econômico, social e ambiental.

  Principais Usos do Carvão Vegetal

            O Brasil ainda faz uso do carvão vegetal na produção industrial, notadamente as siderúrgicas, uma prática que deixou de ser desenvolvida nos países centrais,

             Diante disso, cerca de 85% do carvão produzido é utilizado nas indústrias, as residências respondem por 9% do consumo e o setor comercial como pizzarias, padarias e churrascarias 1,5%.

  Principais Problemas Ambientais

  Emissões de CO²

Quando a madeira é transformada em carvão vegetal são lançadas à atmosfera quantidades de C que estavam imobilizadas nas florestas, contribuindo para aumentar o inventário de CO2 no meio ambiente, ocasionando o aquecimento global e as consequentes mudanças climáticas.

 Desmatamento Acentuado

 Aproximadamente 70% da produção nacional de carvão vegetal é feita por pequenos produtores com o uso de equipamentos rudimentares.

 Nessas condições é comum a derrubada de matas nativas para reduzir o custo da matéria prima, propiciando uma contribuição ao desmatamento e o consequente comprometimento de nossa biodiversidade (um patrimônio estratégico em termos de seu potencial para produção de fármacos, resinas, cosméticos, madeiras nobres, alimentos, etc.).

 Em resposta ao descontrolado desflorestamento, Minas Gerais aprovou uma lei que virtualmente proíbe a coleta de carvão vegetal de matas nativas até 2018.

 A Companhia Vale do Rio Doce também adotou medidas para garantir que suas compras de carvão vegetal sejam provenientes de reflorestamentos, ou seja, a madeira usada como matéria prima nos fornos para produção de ferro gusa não pode ter como origem as florestas nativas (em especial o cerrado).

 Conclusão:

              Embora a indústria do carvão seja estratégica para a economia brasileira os seus impactos ambientais precisam ser considerados e combatidos de modo a tornar a atividade mais sustentável.

            Nesse contexto os grandes desafios da indústria siderurgia a carvão vegetal são os seguintes:

1-Promover a redução de emissões de GEE (Gás Efeito Estufa) com vistas a atender o compromisso assumido pelo governo brasileiro, em 2009, na COP-15(8 a 10 milhões de t de CO2eq até 2020);

2-Evitar o desmatamento de florestas nativas (no período, 2003 a 2012, estima-se que florestas plantadas e nativas participaram respectivamente com 57% e 43% na produção de carvão vegetal);

3-Incrementar a inovação e a competitividade no que concerne à modernização dos processos de produção de carvão vegetal. A melhoria da conversão de madeira em carvão vegetal pode gerar a redução da necessidade de uso das nossas florestas nativas de 32% para 26%, mesmo se considerarmos a projeção de um aumento da produção de ferro gusa das atuais 8,2 milhões para 11 milhões de toneladas em 2020.

           O Plano Setorial de Reduções de Emissões da Siderurgia a Carvão Vegetal foi lançado pelo governo federal em 2010 não apenas para promover o atingimento da meta de redução de emissões assumida voluntariamente no âmbito do Acordo de Copenhague, mas principalmente para induzir a modernização da produção do carvão vegetal necessária para consolidar a sustentabilidade da produção do ferro-gusa a carvão vegetal.

 

A Mineração do Ouro e o Câncer

A imprensa noticiou recentemente a ocorrência anormal de casos de câncer na cidade mineira de Paracatu, área histórica de mineração situada no noroeste de Minas Gerais, que, ainda conforme a denúncia, estariam associados à presença de arsênio retirado durante o processo de beneficiamento na mineração do ouro

O ouro extraído encontra-se originalmente em rochas ricas em arsenopirita, um mineral que possui alto teor de arsênio. Assim, a operação implica na geração de um resíduo perigoso (arsênio) que pode ocasionar graves impactos sobre os ecossistemas e saúde humana

 Segundo Enríquez (2007), o número de casos de câncer aumentou significativamente em Paracatu nos últimos anos, assim como o número de internações por doenças dos aparelhos circulatório e respiratório.

Para melhor compreendermos a questão devemos inicialmente considerar que toda atividade econômica possui uma estreita vinculação com o meio ambiente que pode ser observada nas seguintes dimensões:

  •  Aumento da demanda sobre bens e serviços ambientais (ex.: água, solo, oceanos, biodiversidade, etc.);
  • Geração de resíduos e/ou processos poluentes (ex.: indústria de produtos químicos, resíduos da construção civil, etc.);
  • Produção de Passivos Ambientais que podem vir a comprometer o meio ambiente (ex.: barragens de resíduos químicos, tanques em postos de combustíveis, etc.).

Na realidade o problema observado em Paracatu ocorre em muitos países e tem um nome peculiar: passivo ambiental.

O passivo ambiental é um valor financeiro associado à recomposição dos danos ambientais gerados por uma determinada atividade econômica (metalúrgica, siderúrgica, fábrica de celulose, mineradoras, etc.).

Ou seja: se uma empresa gera algum dano ambiental decorrente de sua produção deverá arcar com os diversos custos financeiros associados à recuperação do meio ambiente.

A nossa história em Paracatu começa em 1987, quando a Companhia Rio Paracatu (RPM) iniciou a mineração de ouro de forma empresarial naquele município.

Em 2004, a companhia foi comprada pela empresa canadense Kinross Gold Corporation cujas instalações compreendem uma mina a céu aberto, uma usina de beneficiamento e uma área para disposição de rejeitos minerais, além da infraestrutura superficial (KINROSS, 2010).

Estima-se que as reservas dessa mina a céu aberto, situada a 2 km do centro urbano de Paracatu, deverão se esgotar em 2040.

O conflito atualmente presente na região se dá por conta de dois fatores.

O primeiro fator diz respeito aos danos ambientais, devido à grande concentração de rejeitos depositados em nascentes de água potável de abastecimento público.

A operação apresenta-se como o mais grave caso de poluição associado à mineração de ouro no mundo, uma vez que a mina explorada possui baixos teores de ouro (0,4 g/t de minério), o que implica no descarte de grandes volumes de rejeitos contendo arsênio e outros poluentes.

Além disso, a mi­neradora também é responsável pelo acirramento dos conflitos de uso vinculados aos recursos hídricos, captando e utilizando três vezes mais “água nova” do que toda a cidade de Paracatu, além de devolver água suja para o ambiente.

O segundo fator de conflitos entre mineradora e comunidade está associado ao fato de que a companhia ignora os direitos das comu­nidades quilombolas, o que acaba sendo facilitado pela omissão dos órgãos ambientais estaduais.

O Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e saúde no Brasil afirma que o projeto de expansão da Mineração/Kinross no rio Paracatu atinge os territórios quilombolas de Machadinho, Amaro e São Domingos, certificados pela Fundação Cultural Palmares em dezembro de 2004, e em processo de reconhecimento e titulação pelo Incra.

O quadro se agrava ainda mais com o projeto de expansão da Kinross Gold Corporation de triplicar a produção anual de ouro o que demandará maior utilização da água do rio Paracatu e de outras fontes, como o córrego Machadinho, represado na nova barragem da empresa.

A nova barragem de rejeitos da Kinross ocupa um vale que originalmente pertencia à comunidade quilombola Machadinho que vendeu suas terras à mineradora e ocupa a periferia da cidade.

A comunidade de São Domingos, por exemplo, segue ocupando seu território tradicional e lutando para regu­larizar a área como território quilombola. O volume dos riachos Santos Reis e Poções, que correm dentro do território da comunidade, apresentam redução de volume devido às atividades de mineração, que poluem e assoreiam as águas.

A mineradora minimizou ou omitiu os impactos socioambientais negativos nos processos de licenciamento, o que impediu o estabelecimento de medidas necessárias de precaução e prevenção.

Em sua defesa a empresa alega que a expansão da capacidade produtiva beneficiará toda a população local com o aumento do número de empregos diretos e indiretos, a duplicação da arrecadação de impostos para o município, além do aumento da renda regional.

 A princípio poderíamos pensar que se trata de um “trade off” entre o meio ambiente e o progresso econômico para que possam ser gerados benefícios às populações. A defesa da mineradora nos induz a pensar que as comunidades locais foram suficientemente alertadas para todos os resultados associados ao projeto, fossem positivos ou negativos.

 Na realidade os impactos ambientais, notadamente quanto à saúde da população local, não foram totalmente identificados e comunicados à sociedade para que fosse adotada uma solução de consenso.

 Em outras palavras, a retirada do arsênio durante o processo de beneficiamento do minério acarreta danos muito superiores àqueles eventuais benefícios econômicos.

Conclusão

A indústria de mineração e transformação mineral contribui com aproximadamente 6% do nosso PIB.

De acordo com informações do Serviço Geológico Brasileiro o efeito multiplicador do setor mineral quanto à criação de empregos alcança 1:13, ou seja, para cada posto de trabalho existente no setor são criadas 13 outras vagas ao longo das diversas cadeias produtivas.

 Assim, entendemos que a mineração possui significativa importância para o desenvolvimento socioeconômico de nosso país, motivo pelo qual deve ser objeto de contínuo incentivo governamental vinculado à concessão de benefícios fiscais, financeiros e creditícios, bem como à implantação de infraestrutura compatível com as suas necessidades e ritmo de crescimento.

 Entretanto, apesar da crescente importância do setor para a economia nacional, em especial no que toca à geração de empregos, renda e tributos, não há como desconsiderar a existência de diversos impactos ambientais que, pelo seu potencial degradador, merecem destaque e acompanhamento por parte dos órgãos licenciadores:

  1.  Uso Intensivo de Água
  2. Degradação da paisagem
  3. Contaminação de solo, água e atmosfera por acúmulo de metais pesados
  4. Redução do oxigênio dissolvido dos ecossistemas aquáticos
  5. Assoreamento de rios
  6. Acidificação dos Rios (Drenagem Ácida de Mina)
  7. Doenças Respiratórias

A questão envolvendo o surgimento de casos de câncer em Paracatu merece estudos e avaliações mais profundas de modo a identificar as reais causas daquelas ocorrências.

Para que possamos identificar os responsáveis e aplicar as penas legais é necessário que os órgãos de responsáveis pelo processo de licenciamento ambiental e posterior fiscalização sejam suficientemente capacitados, em especial no que concerne ao seu corpo técnico, bem como quanto à dotação orçamentária adequada.

 Caso seja comprovada a responsabilidade da mineradora, deve-se considerar a Teoria do Risco Integral com a condenação da mesma ao pagamento dos tratamentos de saúde, indenizações por danos morais e recomposição dos padrões de qualidade do meio ambiente, bem como ao pagamento das multas administrativas a serem aplicadas pelos órgãos ambientais competentes.

  Marcelo de M.R. Quintiere      Mestre em Gestão Ambiental do Meio Ambiente, auditor do TCU e escritor.

Felipe Quintiere Maia     Graduando em Engenharia Ambiental, sócio da empresa Ambiental – Auditoria e Consultoria em Meio Ambiente.

 

 

Bibliografia Consultada

 

ENRÍQUEZ, M. A. R. S. Mineração: maldição ou dádiva? Os dilemas do desen­volvimento sustentável a partir de uma base mineira. 2007. Tese (Doutorado) – Universidade de Brasília, Brasília, 2007.

 

QUINTIERE, Marcelo de M.R. Passivos Ambientais, Ed. Publit Soluções Editoriais. Rio de Janeiro, 2010

 

SANTOS, M. J.; ARAÚJO, P. R. R. Ameaças ambientais de uma mineração a céu aberto. In: ENCONTRO ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM AMBIENTE E SOCIEDADE,5. Florianópolis: ANPPAS, 2010. Disponível em:

<http://www.anppas.org.br/encontro5/cd/artigos/GT4-748- 797-20100828130756.pdf>.

 

SANTOS, M. O ouro e a dialética territorial em Paracatu: opulência e resistência. 2012. Dissertação (Mestrado) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2012.

A Água em São Paulo

            Ao longo deste ano de 2014 acompanhamos com crescente apreensão a questão da falta da água no Estado de São Paulo e seus reflexos socioeconômicos e ambientais.

            A primeira questão que devemos considerar está associada às origens do problema, ou seja, quais os elementos que podem explicar o crescente déficit hídrico na região.

            Dizem os especialistas que há uma redução no volume de precipitação em diversas regiões do país. Assim, com a redução do volume de chuvas e a manutenção do consumo, há maior déficit.

            A redução das chuvas está, ao que parece, associada ao denominado “Efeito Estufa” e ao consequente processo de aquecimento global.

            Há uma certa lógica nesse argumento, uma vez que o aquecimento global já mostra suas faces em muitos pontos do planeta.

            O cientista brasileiro Antônio Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), concluiu em seu recente relatório intitulado “O Futuro Climático da Amazônia” que a floresta amazônica apresenta 20% de sua área degradada e outros 20% já desmatados.

         Esses percentuais elevados representam maior risco de que a floresta amazônica comece a falhar em seu importantíssimo papel de regulação do clima na América do Sul.

          O processo de bombeamento natural associado à floresta consiste na retirada de água das regiões mais úmidas do continente e seu transporte gradual, via atmosfera, até as outras regiões mais secas.

           Dessa forma a floresta ajuda a manter o equilíbrio, propiciando melhores condições climáticas naquelas regiões localizadas no interior e, também, ao sul de nosso continente.

           O equilíbrio climático representa um significativo exemplo daquilo que denominamos como um “serviço ambiental” prestado pelas florestas.

           É necessário compreender que as florestas são fontes não apenas de madeiras e minérios, mas, também, oferecem serviços menos visíveis e compreendidos, tais como a extensa biodiversidade e a regulação climática.

           Infelizmente esse frágil ecossistema está em risco em razão de nossa incapacidade de fiscalizar e impedir os processos de degradação da Amazônia.

            Se a degradação da floresta se mantiver nos níveis atuais haverá, em futuro próximo, uma quebra de sua capacidade de resistência.

           Em termos mais técnicos teríamos o rompimento da resiliência da floresta que não mais poderia retornar ao seu ponto de equilíbrio natural. Assim, é possível que alcancemos um ponto de “não retorno” onde os processos de degradação serão autoalimentados, ocasionando o colapso de todo o sistema.

           Todos seremos afetados, em maior ou menor grau, sendo que os impactos mais severos estarão reservados aos países mais pobres que não dispõem de capital ou tecnologia para superar o quadro futuro de dificuldades.

           Os impactos sobre a agricultura ocorrerão em nível mundial, uma vez que o risco de quebras de safras decorre da sinergia entre diversos elementos, tais como:

 1. Redução da área disponível para plantio.

            A disponibilidade física de terras aptas para o plantio deverá diminuir em função da ampliação dos processos de desertificação ou mesmo do alagamento de áreas litorâneas anteriormente usadas na agricultura.

2. Redução da adaptabilidade das espécies em razão das mudanças de temperatura, precipitação, umidade, etc.

           As mudanças climáticas podem ser traduzidas em alterações não apenas na temperatura local, mas também em termos da disponibilidade de água para os cultivos.

           Muitas cultivares de valor econômico são sensíveis às pequenas alterações nos padrões de temperatura e/ou precipitação, reduzindo ou paralisando seus processos de reprodução, germinação e crescimento vegetativo.

3. Surgimento de novas pragas e doenças.

           As alterações climáticas podem propiciar o surgimento de novas pragas, insetos e doenças em áreas onde anteriormente não existiam.

           Assim, uma pequena elevação na temperatura média ou uma mudança nos níveis de umidade local podem facilitar a introdução de insetos como vetores de doenças, reduzindo a produtividade.

           Da mesma forma haveria maior probabilidade para o surgimento de doenças transmitidas por fungos, vírus, nematoides, bactérias e outros.

            Sei que a resistência a esses argumentos é enorme….

           Mas o fato real é que aqui no Brasil o clima JÁ APRESENTA ALTERAÇÕES que nos conduzirão a um quadro de caos socioeconômico se não forem adotadas medidas emergenciais imediatamente.

            No caso específico do Estado de São Paulo acredito no êxito, a médio prazo, de algumas medidas importantes, tais como:

1. Programa de Replantio

            Atualmente é possível verificar, em todas as regiões do país, um processo insustentável de exploração das áreas agricultáveis. Nesse processo de exploração o plantio ocorre até que o trator “molhe suas rodas no rio”!

           Assim, as matas ciliares são destruídas e propiciam o assoreamento de rios e nascentes. O resultado é a seca e a redução da produtividade.

         Acredito que o país deveria estruturar um maciço programa de reflorestamento em todos os estados, de modo a permitir a recuperação ambiental.

          É importante destacar que os reflorestamentos devem ser heterogêneos, com a utilização de espécies nativas, evitando os malefícios dos reflorestamentos homogêneos (ex.: eucalipto, etc.).

2. Educação Ambiental

           O Brasil é um país estranho onde as liberdades e direitos são assimilados na velocidade da luz, enquanto os deveres e obrigações se locomovem no ritmo de um carro de bois.

           Para ilustrar a situação basta verificar que, em plena seca de São Paulo, muitas centenas de pessoas lavam tranquilamente suas calçadas e carros como se fosse uma atividade corriqueira.

            Essas pessoas reclamam da falta d’água em suas torneiras (o que seria um DIREITO fundamental), mas não enxergam que as suas próprias atitudes potencializam os problemas ambientais (o que implica em conhecer e cumprir com seus DEVERES).

          Porque o governo não investe em campanhas educacionais para racionalizar o consumo de água?

         A resposta é simples: os governantes têm receio de que uma campanha educativa com esse foco possa ser confundida pelos eleitores como um RACIONAMENTO com óbvios reflexos negativos nas urnas.

         Então, na visão míope desses políticos despreparados, é melhor garantir a falsa liberdade do consumo irracional ao invés de adotar medidas defensivas e preventivas cujos resultados são sustentáveis e perenes.

            Devemos, entretanto, lembrar que a educação ambiental é um processo cujos impactos positivos costumam ocorrer ao longo das décadas.

            As crianças e jovens de hoje que, bem orientadas e mais conscientes, serão os pais de amanhã.

             Precisamos implantar um ciclo virtuoso no país, não apenas sob o aspecto ambiental, mas também no que diz respeito a outros aspectos da vida nacional, tais como a moralidade, ética, etc.

            Assim, devemos começar ONTEM!!!!

           É imperativo que todos tenhamos consciência das engrenagens ambientais que regulam nosso planeta e de que as menores ações podem, quando adotadas em conjunto, gerar imensos benefícios.

3. Descentralização Econômica

           Ao observarmos a cidade de São Paulo somos induzidos a concluir que há uma enorme concentração populacional que se manifesta de diversas formas:

  • Sobrecarga nos serviços públicos (saúde, educação, saneamento, segurança, habitação, energia, etc.);
  • Aumento dos níveis de poluição em todas as suas modalidades, gerando doenças graves à população;
  • Maiores dificuldades de logística;
  • Aumento de custos; etc.

             Os estados deveriam investir em processo de descentralização econômica, gerando empregos, renda e tributos em outras regiões menos desenvolvidas.

            Reconhecemos que não haveria um decréscimo acentuado no consumo de água pelo conjunto das indústrias, mas o processo de descentralização reduziria o consumo excessivo em regiões específicas (ex.: Cidade de São Paulo e outras capitais de grande porte)

4.  Mecanismos de Comando e Controle 

          Em complementação ao processo de educação ambiental, cujos resultados necessitam de prazos mais dilatados, o governo poderia instituir os denominados mecanismos de “Comando e Controle”, penalizando o consumo excessivo por meio de cobrança de impostos.

         Os percentuais de cobrança deveriam crescer na medida em que fosse caracterizada a reincidência do infrator e os recursos arrecadados seriam necessariamente aplicados em projetos voltados ao controle dos desequilíbrios (ex.: projetos de reflorestamento, etc.).

 CONCLUSÃO

         Os sintomas da crise atual são reflexos de um descompromisso ambiental que vem ocorrendo ao longo de gerações, no Brasil e no mundo como um todo.

          A ideia de que o meio ambiente é um eterno provedor de matérias primas a custos reduzidos é equivocada e induz ao consumo desordenado e excessivo.

         O déficit hídrico pode ser combatido no Brasil com a adoção de um conjunto de medidas de curto e médio prazos, minimizando os reflexos sobre a nossa população.

         O único ingrediente que nos parece estar em falta é a chamada “vontade política”.

A LEI PRECISA SER CUMPRIDA

               O Brasil possui enormes vantagens competitivas associadas ao clima, extensão territorial, dinamismo da economia e ausência de movimentos separatistas.

                Apesar dessas vantagens somos conhecidos, também, pela extrema tolerância e leniência com que tratamos assuntos sérios como as agressões ao meio ambiente e o desrespeito à legislação, sendo tristemente notório o fato de que temos “leis que não pegam”.

                Um exemplo concreto é a tentativa de prorrogação dos prazos estabelecidos na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS – Lei n. 12.305/2010) para eliminação dos lixões existentes os municípios.

A PNRS trouxe profundas alterações no gerenciamento dos resíduos sólidos no Brasil, dentre as quais se destacam:

  • A obrigatoriedade de desativação dos “lixões” até 2014;
  • A implantação da logística reversa;
  • O estímulo à coleta seletiva;
  • O desenvolvimento obrigatório dos Planos de Gestão de Resíduos Sólidos pelos entes federados até agosto de 2012;
  • A responsabilidade compartilhada durante todo o ciclo de vida dos produtos;
  • O estímulo à formalização e capacitação das cooperativas de catadores de resíduos;
  • A construção de aterros sanitários destinados ao recebimento exclusivo de rejeitos;
  • O estímulo à indústria da reciclagem e aos processos de reutilização, dentre outros.

                Os lixões são responsáveis por inúmeros problemas socioeconômicos e ambientais, dentre os quais se destacam:

  • Proliferação de vetores de doenças;
  • Produção de chorume e consequente contaminação do solo e da água subterrânea;
  • Geração de metano, gás derivado da decomposição da matéria orgânica, considerado como um dos principais responsáveis pelo processo de aquecimento global;
  • Marginalização do homem;
  • Contaminações por metais pesados, com severos danos à saúde humana, etc.

                A erradicação dos lixões pressupõe a observância e o cumprimento de etapas para o completo cumprimento da lei, a saber:

  • Desativação:

                Etapa onde não se permite mais nenhum depósito de resíduos/rejeitos;

  • Isolamento:

                A área é submetida ao processo de encapsulamento ou à mineração do lixão de forma a minimizar a geração de efluentes líquidos e/ou gasosos (chorume e gás metano respectivamente), bem como a retirada dos resíduos e rejeitos, configurando a limpeza da área;

  • Descontaminação:

                 A área é submetida ao processo de descontaminação após a retirada dos resíduos/rejeitos. O objetivo básico consiste em minimizar os riscos de contaminação dos ecossistemas, bem como os impactos negativos sobre a saúde humana.

                Em outras palavras, a simples desativação da área ocupada com o lixão, impedindo o depósito de novos materiais, não garante a melhoria nas condições ambientais, uma vez que o material ali depositado continuará a contaminar o solo, água e atmosfera através da emissão continuada de chorume e metano.

               Quais são as sanções aplicáveis em caso de descumprimento das normas estabelecidas na PNRS?

              Devemos relembrar que a PNRS possui estreita vinculação com a denominada Lei dos Crimes ambientais (Lei n.º 9.605/98), conforme disposto nos artigos a seguir:

 PNRS (Lei n.º 12.305/2010):

 “Art. 29. Cabe ao poder público atuar, subsidiariamente, com vistas a minimizar ou cessar o dano, logo que tome conhecimento de evento lesivo ao meio ambiente ou à saúde pública relacionado ao gerenciamento de resíduos sólidos.”

 “Art. 51. Sem prejuízo da obrigação de, independentemente da existência de culpa, reparar os danos causados, a ação ou omissão das pessoas físicas ou jurídicas que importe inobservância aos preceitos desta Lei ou de seu regulamento sujeita os infratores às sanções previstas em lei, em especial às fixadas na Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que “dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências”, e em seu regulamento.”

 Lei dos Crimes Ambientais (Lei n.º 9.605/98):

 “Seção III

Da Poluição e outros Crimes Ambientais

 Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:

 Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

  •  1º Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa.

  •  2º Se o crime:

I – tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;

II – causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;

III – causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;

IV – dificultar ou impedir o uso público das praias;

V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:

Pena – reclusão, de um a cinco anos.

  •  3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível.”

(…)

 “Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos:

 Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

I – abandona os produtos ou substâncias referidas no caput ou os utiliza em desacordo com as normas ambientais ou de segurança; (Incluído pela Lei nº 12.305, de 2010)

II – manipula, acondiciona, armazena, coleta, transporta, reutiliza, recicla ou dá destinação final a resíduos perigosos de forma diversa da estabelecida em lei ou regulamento. (Incluído pela Lei nº 12.305, de 2010)

                Os gestores municipais pouco fizeram para adaptar seus municípios às novas exigências legais.

                O tempo passou e grande parcela dos gestores municipais passou a se articular, com o apoio de muitas associações de municípios, com o objetivo de prorrogar os prazos inicialmente previstos na PNRS.

                A argumentação é a mesma de sempre: recursos orçamentários limitados, corpo técnico pouco qualificado e carência de infraestrutura.

                Agora, às vésperas da eleição presidencial de 2014, a pressão dos gestores municipais e respectivas associações parece ter surtido algum efeito: a Câmara dos Deputados propôs a prorrogação do prazo para desativação dos lixões até 2018!!

                A matéria agora seguirá para exame no Senado, mas este absurdo precisa ser denunciado.

                Os lixões são ilegais frente à PNRS e imorais na medida em que as administrações municipais gastaram verdadeiras fortunas ao longo de décadas para coletar o lixo e depositá-lo de forma inadequada, formando um enorme passivo ambiental cujo controle obrigará o Estado a arcar com elevados custos financeiros.

                Na prática os 3.500 municípios inadimplentes continuarão convivendo com suas já conhecidas limitações, perpetuando a operação de seus lixões!

                Além disso, as tecnologias para tratamento adequado de resíduos, bem como a construção de aterros sanitários, são atividades onerosas que deveriam ser assumidas preferencialmente por consórcios municipais, possibilitando a redução dos custos.

              Penso que o mais correto seria a intervenção do Ministério Público junto aos municípios inadimplentes, caracterizando o descumprimento dos prazos definidos na PNRSpara eliminação dos lixões e os danos ambientais que podem decorrer daquela situação

              Depois de caracterizada a inadimplência o segundo passo seria a celebraçaõ de  um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta, envolvendo o município inadimplente, o Ministério Público (que tem o poder-dever de promover a tutela dos interesses coletivos latu sensu conforme o artigo 129, III da Constituição Federal) e o órgão ambiental local.

               O citado Termo de Compromisso foi introduzido no Direito brasileiro no início da década de 90, por meio dos arts. 211, da Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente ECA), e 113, da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor – CDC) que modificaram a lei de ação civil pública (7.347/85), garantindo aplicação do compromisso de ajustamento de conduta aos direitos coletivos lato sensu.

             A celebração do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta garante maior celeridade na reparação e prevenção de danos ambientais, permitindo a identificação dos faltosos e a indicação de um prazo consensual cumprimento das determinações da PNRS.

             Além disso, esse instrumento jurídico tem as características de um título executivo extrajudicial, ou seja: o descumprimento daquilo que foi estabelecido ampara a sua execução direta.

              Em outras palavras, o gestor municipal encontra-se obrigado a executar as ações, atividades e metas acordadas e, caso permaneça a condição de inadimplência, estará consignado o descumprimento do Termo de Compromisso, não havendo a necessidade de instaurar novo procedimento judicial.

                A conclusão é que não podemos mais postergar a adoção das medidas voltadas ao saneamento dos lixões, haja vista os problemas de ordem socioeconômica e ambiental que são gerados.

              A simples prorrogação dos prazos estabelecidos na PNRS não agregará nenhum valor concreto, constituindo-se em mais um subterfúgio para empurrar o lixo para debaixo do tapete.

 

Passivos Ambientais em ATIVIDADE

             Dizem que no Brasil só colocamos cadeado no portão depois dos assaltos.

            Não sei se é verdade, mas a sucessão de acidentes em barragens de resíduos no Brasil deveria gerar medidas concretas do governo e iniciativa privada de forma a garantir a segurança da população.

            No dia 10 de setembro houve um acidente na barragem de resíduos de mineração de propriedade da mineradora Herculano, em Itabirito (MG), causando a morte de três pessoas e diversos prejuízos financeiros.

            A barragem rompida é uma das quatro contenções existentes na área da mineradora e havia alcançado a sua capacidade máxima, estando desativada. De acordo com a Prefeitura de Ibirité, a documentação da mineradora está em dia e a empresa tem licença ambiental para operar na cidade.

           De acordo com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Minas Gerais (Semad) as auditorias nas barragens são realizadas por empresas independentes e observam as condições físicas e hidráulicas para operação das estruturas. No caso das barragens da Classe II, como a B1, a auditoria é realizada a cada dois anos.

           A carga de rejeito de minério despejada atingiu afluentes do Rio das Velhas, que abastecem Belo Horizonte e cidades da região metropolitana. A preocupação das autoridades é evitar que a poluição chegue à estação de tratamento de água Bela Fama e comprometa o abastecimento.

           De acordo com informações prestadas pelo Comitê da Bacia do Rio das Velhas (CBH), os córregos Silva e do Eixo, afluentes do Rio Itabirito que, por sua vez, deságua no Rio das Velhas, foram contaminados pelos rejeitos de minério.

           Os reflexos e medidas governamentais já começam a surgir:

  • O caso está sendo acompanhado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Polícia Civil, Departamento Nacional de Produção Mineral e Secretaria de Estado de Meio Ambiente;
  • O Núcleo de Emergências Ambientais e Desenvolvimento Sustentável da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) investiga os danos ambientais que podem ter ocorrido;
  • O Departamento Nacional de Produção Mineral, a autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia, interditou a mina por tempo indeterminado.
  • A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) determinou a suspensão imediata das atividades da mineradora.

            Este acidente não é, infelizmente, uma exceção ou um “ponto fora da curva” no Brasil, haja vista a ocorrência de outros graves acidentes ambientais.

            Como exemplos podemos relembrar:

  1. Rompimento de barragem de resíduos químicos (lixívia negra) derivados da produção de papel na cidade de Cataguases (MG);
  2. Terreno doado pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) ao Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda para construção de casas populares, sendo que a área foi utilizada durante 13 anos como depósito de milhares de toneladas de resíduos industriais com alto poder de contaminação;
  3. Deslizamento ocorrido no “Morro do Bumba”, em Niterói (RJ). As moradias foram construídas sobre um antigo lixão existente em uma área com declive, que foi posteriormente recoberta pela vegetação. Com as chuvas muito intensas o “solo – lixo” encharcou, ficou pesado e desceu, matando 48 pessoas;
  4. Construção do Shopping Center Norte em São Paulo sobre um antigo lixão. A matéria orgânica existente naquele lixão ainda está em processo de decomposição, produzindo enormes quantidades de metano, um gás do efeito estufa que contribui para o aquecimento global e explode com razoável facilidade
  5. A Contaminação em Santo Amaro da Purificação (BA) pela Usina Plumbum, localizada a 300 metros da margem do rio Subaé, contaminou, ao longo de 32 anos, a população da cidade com resíduos de chumbo (Pb) e cádmio (Cd), em nível endêmico.

           Todos esses casos representam aquilo que tecnicamente denominamos como sendo “Passivos Ambientais”

          O passivo ambiental consiste em um valor monetário que procura expressar, ainda que sob a forma de estimativa, qual o gasto total que determinada empresa ou instituição deverá arcar no futuro em decorrência dos impactos ambientais gerados por sua atividade produtiva.

            De acordo com o IBRACON – Instituto dos Auditores Independentes do Brasil, o passivo ambiental consiste no valor dos investimentos necessários para reparar toda a agressão que se pratica ou praticou contra o meio ambiente.

            Conforme destaca MALAFAIA, a essência do passivo ambiental está no controle e reversão dos impactos das atividades econômicas sobre o meio natural, envolvendo, portanto, todos os custos das atividades que sejam desenvolvidas nesse sentido.

            Para UEHARA, o passivo ambiental se constitui no dia-a-dia em contrapartida às alterações ambientais provocadas pelas atividades econômicas desempenhadas pelas empresas.

            O passivo ambiental representa toda e qualquer obrigação destinada, única e exclusivamente, a promover investimentos em prol de ações relacionadas à extinção ou amenização dos danos causados ao meio ambiente, inclusive os valores direcionados a investimentos na área ambiental (MALAFAIA).

             Embora estejam comumente associados a acidentes e danos que afetam o meio ambiente os passivos ambientais não estão restritos apenas às barragens de resíduos, sendo possível observar a sua presença associada a outras origens, tais como:

  • Custos associados às ações para reparação de danos ambientais;
  • Custos de indenizações a terceiros em decorrência de acidentes ambientais.
  • Antigos tanques de combustíveis em postos de serviço;
  • As instalações industriais desativadas ou abandonadas;
  • Os resíduos de processos industriais lançados sem controle na atmosfera, nos corpos hídricos e no solo;
  • Produtos descartados ao final de sua vida útil sem que sejam adotadas medidas de proteção adequada (pneus, baterias automotivas, computadores e seus acessórios, baterias de telefones celulares e outros);
  • Lixões a céu aberto;
  • Solo contaminado pelo uso de agrotóxicos;
  • Manutenção de equipes ou departamentos voltados para a questão ambiental;
  • Aquisição preventiva de equipamentos para controle da poluição; etc.

             Os passivos ambientais existem aos milhares em nosso país e, na grande maioria dos casos, não são conhecidos pelos órgãos ambientais estaduais e municipais. Estamos diante de uma ameaça significativa que, a depender dos produtos tóxicos envolvidos, poderá ocasionar uma tragédia sem precedentes. (Este trecho foi escrito em uma matéria de minha autoria, publicada no Blog do Quintiere em abril de 2013…).

              No caso específico das barragens de acumulação de resíduos tóxicos, tema deste artigo, os riscos ao meio ambiente e à saúde humana são significativos e potencializados em razão dos seguintes fatores:

  • As barragens estão geograficamente dispersas, o que dificulta as ações de fiscalização;
  • Os componentes tóxicos depositados nas barragens constituem um amplo leque de produtos químicos danosos aos ecossistemas, havendo possibilidade de sinergia com elevação dos riscos ambientais;
  • Muitas barragens encontram-se situadas em locais ermos com reduzido controle e fiscalização, possibilitando eventual descarte clandestino ou ilegal de elementos altamente tóxicos sem que haja nenhum tipo de acompanhamento por parte da empresa ou dos órgãos ambientais;
  • Muitas barragens estão abandonadas e seu estado de conservação é precário, o que facilita a ocorrência de rompimentos e vazamentos;
  • O custo financeiro para redução do volume dos elementos tóxicos, sua neutralização ou mesmo o desenvolvimento de alternativas que possibilitem o seu uso econômico é bastante elevado, o que inibe a atuação das empresas responsáveis.

              Diante da abrangência e magnitude do problema é necessária a atuação conjunta do Estado, sociedade e setor privado.

             O governo federal avançou nessa questão com a publicação da Lei n.º 12.334/2010 que estabeleceu a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), contemplando aquelas barragens destinadas à acumulação de água para quaisquer usos, à disposição final ou temporária de rejeitos ou à acumulação de resíduos industriais, além de criar o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB).

            De acordo com essa lei, os proprietários das barragens são obrigados a desenvolver uma série de atividades de modo a garantir maior segurança à manutenção e operação daquelas estruturas.

             Além do óbvio compromisso (moral, ético e legal) de indenizar as famílias dos trabalhadores mortos e demais contaminados, as empresas ainda são obrigadas a reparar os danos gerados ao meio ambiente.

             Quanto à necessidade de reparação dos danos ambientais destacamos alguns aspectos legais envolvidos, em especial a Teoria Objetiva da Responsabilidade e os dispositivos legais que tratam do tema.

            A Teoria Objetiva da Responsabilidade tem como elementos básicos apenas o dano causado e o nexo de causalidade, não sendo necessário o desenvolvimento de provas ou elementos comprobatórios acerca da culpa do infrator.

            Desta forma o processo se torna mais célere, garantindo que os recursos destinados à compensação dos danos vinculados aos acidentes ambientais sejam prontamente obtidos, protegendo de modo mais efetivo o meio ambiente.

            O Direito Ambiental no Brasil, assim como em outros países desenvolvidos, adota a Teoria Objetiva da Responsabilidade, conforme se verifica nos seguintes dispositivos legais:

  1. Lei n.º 6.938/81 – PNMA Art. 14, § 1º:

                “Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.

  1. CF/ 1988, Art. 225, § 3º:

                 “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

  1. Código Civil de 2002 – Lei n.º 10.406/2002, Art. 927, § único

                        “Haverá a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

            A Teoria Objetiva da Responsabilidade encontra amparo na conhecida Teoria do Risco Integral:

             “Quem recebe os lucros de uma atividade deve estar preparado para assumir os eventuais danos causados a terceiros”.

            Desta forma procura-se internalizar nos custos gerais das indústrias os impactos negativos ao meio ambiente e a obrigatoriedade de promover o seu ressarcimento, evitando a sua equivocada socialização pelo conjunto da sociedade.

            A responsabilidade pelo pagamento dos danos praticados contra o meio ambiente está associada ao conhecido Princípio Poluidor-Pagador, previsto como sendo um dos objetivos centrais da Política Nacional do Meio Ambiente, conforme se verifica no Art. 4º, VII da Lei n.º 6.938/81:

“Art. 4º – A Política Nacional do Meio Ambiente visará:

(…)

VII – à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.”

             A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS – Lei n.º 12.305/2010), instrumento que disciplina a gestão de resíduos em todo o país, estabelece a necessidade de identificação dos passivos ambientais existentes no âmbito dos municípios, inclusive como elemento essencial na elaboração do Plano Municipal de Gestão de Resíduos (art. 19, inciso XVIII).

             Tenho fortes suspeitas de que a fiscalização das barragens de resíduos não está ocorrendo conforme o esperado, uma vez que muitos dos órgãos ambientais sofrem com limitações de ordem orçamentária, carência de pessoal qualificado e infraestrutura deficiente.

CONCLUSÃO

            Devemos realizar um esforço no sentido de fortalecer o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), promovendo a capacitação dos recursos humanos nos órgãos ambientais, elaboração de um orçamento compatível com as atribuições e aquisição de equipamentos mais modernos.

            Se não adotarmos medidas nesse sentido continuaremos a colecionar “surpresas” indefinidamente, algumas com menor impacto e outras (infelizmente) em nível de catástrofes socioambientais.

A Exportação de Celulares

            O Brasil possui aproximadamente 270 milhões de aparelhos celulares, ou seja, mais de um aparelho por habitante.

            Símbolo de status e modernidade o celular virou uma febre em todo mundo: estão em toda parte, hipnotizando os usuários 24 horas/dia. São jogos eletrônicos, mensagens, fotos, músicas, torpedos, pesquisas na Internet, acesso às redes sociais, etc.

            Outro dado interessante é que os celulares são substituídos com frequência cada vez menor em razão dos avanços tecnológicos! As estimativas nos dão conta que um celular tem vida útil de apenas 15 meses, sendo descartado sem apelação e substituído por outro aparelho mais moderno e com mais funções.

              Mas o que acontece com os celulares descartados?

            Os otimistas afirmariam que os celulares são encaminhados para processos de reciclagem onde seus componentes são reinseridos nos processos produtivos.

            Engano!

            No Brasil a reciclagem de celulares alcança apenas 3% do total de aparelhos.

            Isso significa que 97% dos celulares no Brasil não estão associados ao processo de reciclagem! O que será que ocorre com eles?

            Na maioria dos casos os aparelhos são destinados ao lixo comum ou simplesmente esquecidos em nossas gavetas e armários.

            A partir desse comportamento equivocado corremos o risco de graves impactos aos ecossistemas, tais como as contaminações e o comprometimento da qualidade da água subterrânea, do solo agricultável e da biodiversidade por longos períodos de tempo, além dos danos à saúde humana pela presença de metais pesados nas placas de circuitos e nas baterias de celulares.

           Os metais pesados presentes nos celulares podem causar danos severos à saúde, conforme se verifica na tabela a seguir:

Tabela n.º 1: Alguns metais pesados e os efeitos observados sobre a saúde humana.

Metais Efeitos sobre a saúde humana
Cádmio Distúrbios gastrointestinais e edema pulmonar.
Cromo Em níveis bronco-pulmonares e gastrointestinais produzem irritação bronquial, alteração da função respiratória e úlceras gastroduodenais.
Níquel Câncer de pulmão e seios paranasais, dermatites, distúrbios respiratórios, cirrose, insuficiência renal.
Chumbo Síndrome associada ao sistema nervoso central, síndrome astênica (fadiga, dor de cabeça, insônia, distúrbios durante o sono e dores musculares), síndrome hematológica (anemia moderada), síndrome renal (nefropatia não específica, diminuição da depuração da ureia e do ácido úrico), síndrome do trato gastrointestinal (cólicas, anorexia, desconforto gástrico, constipação ou diarreia), síndrome cardiovascular (miocardite crônica, arteriosclerose precoce com alterações cerebrovasculares e hipertensão).
Lítio Afeta o sistema nervoso central, gerando visão turva, ruídos nos ouvidos, vertigens, debilidade e tremores.
Berílio Câncer no pulmão.
Arsênio Doenças de pele, prejudica o sistema nervoso, câncer no pulmão.

            A lista de metais pesados empregados nos celulares é extensa e pouco conhecida por seus usuários.

           Além dos danos à saúde, a contaminação por metais pesados tende a comprometer a capacidade dos ecossistemas de recuperar a sua condição de equilíbrio anterior, denominada de resiliência. Devemos considerar que os metais pesados possuem maior persistência no meio ambiente, sendo mais lenta a neutralização de seu potencial de risco.

            Assim, uma vez ocorrida a contaminação do meio ambiente nem sempre será possível a aplicação de alguma tecnologia capaz de recompor as condições naturais vigentes anteriormente e teremos de arcar com custos muito elevados associados à limpeza das áreas contaminadas e retirada da população local, ocasionando a sobrecarga dos serviços públicos de saúde, saneamento, energia, etc.

           Para evitar que esses componentes poluam o ambiente e prejudiquem a saúde das pessoas, é importante sempre descartar eletrônicos da maneira adequada.

           A Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS – Lei n.º 12.305/2014) introduziu diversas inovações na gestão de resíduos, dentre as quais se destacam:

  • A obrigatoriedade de implantação da coleta seletiva e o tratamento sustentável de resíduos;
  • A responsabilidade compartilhada;
  • A elaboração dos Planos de Gestão de Resíduos para a esfera pública e dos Planos de Gerenciamento de Resíduos para a esfera privada;
  • A logística reversa.

            A logística reversa é um instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.

            Desta forma o produto nocivo retorna dos consumidores aos fabricantes utilizando-se de uma cadeia de logística própria que deverá ser desenvolvida caso a caso, minimizando riscos e possibilitando que grandes volumes de resíduos sejam reciclados ou novamente reutilizados nos processos produtivos.

            Infelizmente a nossa taxa de reciclagem para celulares ainda é muito pequena, apesar do Brasil, segundo a ONU, constituir-se em um dos mercados emergentes que geram maior volume de e-lixo per capita a cada ano. Por ano, cada brasileiro descarta o equivalente a meio quilo de lixo eletrônico.

            A reciclagem dos eletroeletrônicos, em especial os celulares, deveria ser fortemente incentivada pelo governo federal e indústrias do setor. Alguns dados técnicos apresentados a seguir demonstram o potencial econômico da reciclagem.

            Um aparelho celular contém diversos elementos passíveis de reciclagem, podendo alcançar até 80%. Esse percentual deveria, por si só, despertar o interesse de empresários para exploração dessa verdadeira mina de ouro.

           Na verdade o celular poderia ser comparado a um “Micro Carajás”, com a presença de metais nobres, tais como o ouro, prata, paládio, níquel, lítio e outros.

            De acordo com o relatório From Waste to Resources, do programa para o Meio Ambiente das Nações Unidas (Unep), 1 tonelada de celulares (sem as baterias) pode render a seguinte quantidade de metais preciosos:

  • 3,5 quilos de prata;
  • 340 gramas de ouro;
  • 140 gramas de paládio;
  • 130 quilos de cobre.

          Esses percentuais são muito superiores àqueles encontrados nas jazidas minerais exploradas no mundo inteiro, ou seja, o celular e os demais aparelhos eletroeletrônicos possuem uma enorme concentração de metais e, além disso, dispensam as onerosas operações de pesquisa, lavra, transporte e beneficiamento.

           Os metais presentes nos eletroeletrônicos já estão em seu estado mais puro e prontos para reinserção nos processos produtivos.

           Depois de coletado via logística reversa, o plástico é retirado e o restante é moído, ensacado e levado em contâiners para a Bélgica, Alemanha, China e EUA, pois esses países detêm a tecnologia necessária para fazer a extração dos materiais nobres.

           O Brasil, segundo dizem, ainda não possui tecnologia para a reciclagem, extração e reaproveitamento desses materiais, o que me parece bastante estranho se considerarmos que nosso país é a sétima economia do mundo e produz até aviões.

         Qual o problema de exportarmos resíduos?

         De imediato considero alguns aspectos relevantes:

  •  Aspecto Econômico

 Não me parece uma política racional exportarmos lixo eletrônico ou “e-lixo” para geração de todo um ciclo virtuoso de empregos, renda, qualificação da mão de obra e arrecadação de impostos em outros países.

 Os resíduos são considerados passivos ambientais, ou seja, podem acarretar danos severos ao meio ambiente e à saúde humana se não forem convenientemente processados. Os custos financeiros para recuperar os danos decorrentes de acidentes são muito elevados (isso quando existe alguma tecnologia disponível).

  •  Aspecto Legal

 A PNRS proíbe a importação de resíduos sólidos, mesmo que seja com o objetivo de efetuar a sua reciclagem.

 Se um determinado comportamento não pode ser aceito por nós também não deveríamos aceitá-lo como justo ou conveniente para com os demais países.

 A lógica da lei é mais ou menos a seguinte: cada país deve coletar e processar o seu próprio resíduo, evitando exportá-lo para países mais pobres

  •  Aspecto ético ou moral

 Nem sempre a exportação de tecnologias mais sofisticadas (ou de resíduos) pode ser traduzida com benefícios para os países que as recebem!

A indústria siderúrgica é um bom exemplo de exportação de passivos ambientais: no início do século passado era considerada uma indústria estratégica, representando alta tecnologia e poder econômico.

 Depois de algumas décadas os países ricos passaram a transferir as usinas siderúrgicas para países pobres sob o argumento de que a transferência de tecnologia poderia gerar empregos e renda.

 O problema é que os impactos ambientais foram transferidos também, ou seja, a roupagem econômica justificava o dano ambiental, em especial naqueles países onde as leis e regulamentos ambientais ainda eram incipientes.

 Não é ético ou moralmente aceitável exportar lixo eletrônico (e seus problemas).

             Assim, a cada contêiner de celulares exportado nosso país perde divisas, além de desperdiçar uma boa oportunidade de implantar um ciclo virtuoso com a geração de novos empregos, aumento da renda dos trabalhadores, qualificação da mão de obra, dinamização da cadeia produtiva local, redução dos riscos de contaminação dos ecossistemas, maior proteção à saúde, maior arrecadação de tributos, etc.

           As vantagens são muitas e não podem ser desconsideradas por nossos legisladores.

          Penso que deveríamos desenvolver uma legislação federal que proibisse a exportação desse tipo de material, mantendo-o em nosso país para geração dos benefícios acima descritos.

          Evidentemente haveria forte reação imediata por parte daqueles que lucram com as exportações mas, a curto prazo, poderíamos formar joint adventures com empresas estrangeiras especializadas e passar a processar os resíduos de eletroeletrônicos integralmente em nosso país.

          A médio prazo poderíamos contar com o desenvolvimento de tecnologia nacional, fruto de pesquisa em nossas universidades e centros de pesquisa, para processamento mais eficaz desse tipo de material.

            Enfim, as soluções devem contar com a participação do Poder Legislativo, de indústrias nacionais produtoras de eletroeletrônicos e de centros de pesquisa tecnológica.

           Os benefícios, já listados, alcançariam toda a população.

Além da Trituração de Resíduos

Estive em São Paulo dia 9 de setembro para visitar a Feira Internacional RWM Brasil, que abordava o tema reciclagem e gestão de resíduos sólidos, com a participação de 17 países e mais de 80 expositores.

Alguns aspectos me chamaram a atenção:

  • O problema dos resíduos sólidos está presente em todo o mundo, independentemente do regime político ou capacidade financeira dos países;
  • Hoje dispomos de tecnologias sofisticadas para promover uma gestão mais eficaz e econômica dos resíduos sólidos;
  • O Brasil está bastante atrasado com relação ao desenvolvimento de tecnologias, embora seja a 7ª economia do mundo e possua uma população de mais de 200 milhões de habitantes;
  • Sabemos que população e renda são os principais agentes ou componentes que explicam a produção de resíduos, ou seja, quanto maior a população e sua renda per capita maior será a propensão à geração de resíduos;
  • Muitos empresários estão interessados em estabelecer parcerias ou representações comerciais , inclusive com a implantação de plantas industriais;
  • O interesse dos empresários está associado ao tamanho de nosso mercado de resíduos e, também, ao surgimento da Lei 12.305/2010, conhecida como a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que inovou ao estabelecer a obrigatoriedade de efetuarmos o tratamento e a disposição sustentável  dos resíduos e rejeitos;
  • Há, assim, um mercado promissor para empresas de consultoria, auditoria, indústrias de máquinas e equipamentos, prestadores de serviços, empresas da construção civil (aterros sanitários), etc.

Outro aspecto interessante é a enorme quantidade de equipamentos para trituração e separação de resíduos…contei mais de 20 equipamentos em toda a feira!

Alguns expositores apresentavam vídeos de suas máquinas em plena operação, triturando pneus, concreto, rodas de automóveis, madeira, etc.

Outras máquinas, mais sofisticadas, faziam a trituração acompanhada pela separação de resíduos, segregando embalagens PET, metais, papel, etc.

E os visitantes se aproximavam, conversavam e saiam com a sensação de que algo mais estava faltando!

Será que a máquina de triturar resíduos é o novo “vidro colorido para os índios”?

Evidentemente não podemos desconsiderar que a trituração e separação automática de resíduos são componentes importantes para alcançarmos uma gestão eficaz.

A facilitar o acondicionamento dos resíduos a trituração diminui o volume a ser transportado para as indústrias de reciclagem, otimiza as operações de logística e garante uma sensível redução de custos.

Entretanto, a trituração não pode ser considerado a “cereja do bolo” quando se trata da gestão de resíduos…

Precisamos ir além disso!

É necessário estudar e incorporar novas tecnologias para processar os resíduos coletados (e triturados), de modo a permitir a transformação destes em novos insumos a um custo competitivo.

Vejamos o exemplo contido na reciclagem de eletroeletrônicos, tais como os computadores e aparelhos celulares!

Não queremos apenas triturá-los, mas definir processos tecnológicos que possam aproveitar essa enorme quantidade de resíduos de alto valor agregado e possibilitar sua reinserção nos diversos processos produtivos.

A PNRS inovou ao implantar a denominada Logística Reversa, definindo uma gama de produtos que, considerando o seu maior risco para os ecossistemas, deveriam ser coletados e encaminhados prioritariamente às indústrias de reciclagem ou às próprias indústrias produtoras (art. 33).

O Brasil possui mais de 280 milhões de aparelhos celulares, sendo que um considerável percentual destes não resiste a mais de dois anos de uso frente às inovações tecnológicas, sendo sumariamente substituídos…

Os celulares estão contemplados pela PNRS e devem ser submetidos à logística reversa.

E o que ocorre a partir da coleta dos aparelhos? Para onde eles são encaminhados? Quem processa os seus componentes?

Na realidade esses milhões de aparelhos celulares coletados a cada ano são encaminhados ao exterior para processamento em países do sudeste asiático.

Qual o problema de exportarmos resíduos?

Penso em vários elementos do problema:

1) Aspecto Econômico

Não me parece uma política racional exportarmos lixo eletrônico ou “e-lixo” para geração de todo um ciclo virtuoso de empregos, renda, qualificação da mão de obra e arrecadação de impostos em outros países.

Os resíduos são considerados passivos ambientais, ou seja, podem acarretar danos severos ao meio ambiente e à saúde humana se não forem convenientemente processados. Os custos financeiros para recuperar os danos decorrentes de acidentes são muito elevados (isso quando existe alguma tecnologia disponível).

2) Aspecto Legal

A PNRS proíbe a importação de resíduos sólidos, mesmo que seja com o objetivo de efetuar a sua reciclagem.

Se um determinado comportamento não pode ser aceito por nós também não deveríamos aceitá-lo como justo ou conveniente para com os demais países.

A lógica da lei é mais ou menos a seguinte: cada país deve coletar e processar o seu próprio resíduo, evitando exportá-lo para países mais pobres

3) Aspecto ético ou moral

Nem sempre a exportação de tecnologias mais sofisticadas (ou de resíduos) pode ser traduzida com benefícios para os países que as recebem!

A indústria siderúrgica é um bom exemplo de exportação de passivos ambientais: no início do século passado era considerada uma indústria estratégica, representando alta tecnologia e poder econômico.

Depois de algumas décadas os países ricos passaram a transferir as usinas siderúrgicas para países pobres sob o argumento de que a transferência de tecnologia poderia gerar empregos e renda.

O problema é que os impactos ambientais foram transferidos também, ou seja, a roupagem econômica justificava o dano ambiental, em especial naqueles países onde as leis e regulamentos ambientais ainda eram incipientes.

Não é ético ou moralmente aceitável exportar lixo eletrônico (e seus problemas).

O Brasil ainda não acordou para questões dessa natureza! E isso me induz a pensar que alguns estão ganhando um bom dinheiro ou há uma completa falta de bom senso, inclusive por parte do governo e do Congresso Nacional.

É preciso deixar a nossa postura de índio hipnotizado com o “vidro colorido” das tecnologias mais simples e passarmos a pensar nos interesses do país.

Voltaremos a esse tema com maior detalhamento no próximo texto.

E Agora Prefeito?

Após quatro anos de vigência e muitas controvérsias a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) chega a uma encruzilhada que pode vir a comprometer sua eficácia quanto à correta gestão dos resíduos sólidos no Brasil.

A PNRS trouxe diversas inovações que poderão aperfeiçoar a gestão dos resíduos sólidos no Brasil, dentre as quais podemos destacar:

  •  Responsabilidade Compartilhada;
  • Incentivo à Não Geração, Redução, Reutilização e Reciclagem;
  • Gestão Integrada dos Resíduos Sólidos;
  • Estímulo à implantação da Coleta Seletiva;
  • Estímulo à Logística Reversa;
  • Estímulo à Formação de Consórcios Municipais;
  • Elaboração dos Planos de Gestão de Resíduos nas Esferas Administrativas;
  • Elaboração dos Planos de Gerenciamento de Resíduos no âmbito da Iniciativa Privada;
  • Incentivo à Implantação, Formalização, Aparelhamento e Capacitação de Cooperativas de Catadores de Resíduos;
  • Estabelecimento de Prazo para Desativação dos Lixões.

 O prazo final para a desativação dos lixões, um dos pontos mais controversos da PNRS, venceu no dia 2 de agosto e, para nossa tristeza e perplexidade, mais de 60% de nossos municípios ainda não adotaram medidas concretas para solucionar essa questão.

 A prevalência dos lixões demonstra que grande porcentagem do lixo gerado diariamente não recebe o tratamento adequado, representando inconsistências e fragilidades da gestão pública dos resíduos sólidos no Brasil.

 É interessante observar que a “solução dos lixões” independe do tamanho do município ou de sua capacidade financeira, sendo possível observar lixões antigos em operação ou já desativados em praticamente todos os nossos municípios.

Além disso, a presença de lixões significa maiores riscos para a saúde humana e comprometimento dos ecossistemas, com maior probabilidade de degradação da qualidade do ar, solo e água.

O lixão traz inúmeros problemas socioeconômicos e ambientais, dentre os quais se destacam:

  •  Proliferação de vetores de doenças;
  • Produção de chorume e contaminação do solo e da água subterrânea;
  • Geração de metano, gás derivado da decomposição da matéria orgânica e considerado como um dos principais responsáveis pelo aquecimento global;
  • Marginalização do homem;
  • Contaminações por metais pesados, etc.

Devemos considerar, também, que o depósito direto de resíduos em lixões consiste em uma prática obsoleta em termos tecnológicos, propiciando desperdícios financeiros, uma vez que simplesmente enterra grandes volumes de resíduos que poderiam, alternativamente, ser reciclados ou transformados em combustível.

Em razão dos diversos impactos negativos destacados a Política Nacional de Resíduos Sólidos estabeleceu a obrigatoriedade de se promover a desativação dos lixões até agosto de 2014.

O problema é que a simples desativação dos lixões não é suficiente para solucionar o problema da contaminação.

Ao longo das décadas os lixões se transformam em passivos ambientais, ou seja, perigosos depósitos que inviabilizam o uso seguro da área.

 Em outras palavras, a simples desativação da área ocupada com o lixão, impedindo o depósito de novos materiais, não garante a melhoria nas condições ambientais, uma vez que o material ali depositado continuará a contaminar o solo, água e atmosfera através da emissão continuada de chorume e metano.

Seria mais correto, data vênia, pensarmos em “erradicação” dos lixões ao invés de considerarmos apenas a sua “desativação””.

A erradicação dos lixões pressupõe a observância e o cumprimento de etapas para o completo cumprimento da lei, a saber:

  • Desativação:

Etapa onde não se permite mais nenhum depósito de resíduos/rejeitos;

  •  Isolamento:

A área é submetida ao processo de encapsulamento ou à mineração do lixão de forma a minimizar a geração de efluentes líquidos e/ou gasosos (chorume e gás metano respectivamente), bem como a retirada dos resíduos e rejeitos, configurando a limpeza da área;

  •  Descontaminação:

A área é submetida ao processo de descontaminação após a retirada dos resíduos/rejeitos. O objetivo básico consiste em minimizar os riscos de contaminação dos ecossistemas, bem como os impactos negativos sobre a saúde humana.

De quem é a culpa por essa situação?

De início devemos considerar que a criação, perpetuação e expansão dos lixões é fruto do descaso e incompetência técnica de sucessivos governos que, numa visão míope, nunca consideraram a necessidade de recuperar aquelas áreas degradadas e encontrar soluções tecnológicas que pudessem reverter o quadro caótico a seu favor.

 Os argumentos colecionados ao longo das décadas apontam as mazelas de sempre: falta de recursos orçamentários, ausência de vontade política, as tecnologias inadequadas, necessidade de introduzir a coleta seletiva em moldes mais eficazes, dificuldades para conscientizar a população, quadro técnico municipal pouco capacitado, etc.

 O vínculo entre o dano ambiental e o dever de promover o seu ressarcimento está amparado na chamada Teoria Objetiva da Responsabilidade, segundo a qual o agente poluidor é obrigado a arcar com os custos de indenizações e reparação dos danos que causou ao meio ambiente e a terceiros, independentemente de culpa.

 Nesse sentido destacamos o que estabelece a Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA), a Constituição Federal e o Código Civil de 2002:

 1. PNMA – Lei n.º 6.938/81 – Art. 14, § 1º:

“Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.

 2. CF/ 1988 – Art. 225, § 3º:

“As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

 3. Código Civil de 2002 – Lei n.º 10.406/2002 – Art. 927, § único

“Haverá a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

 Isso significa que os municípios são responsáveis pela criação e expansão dos seus lixões, seja em razão do pagamento de elevadas somas ao longo de décadas a título de coleta e disposição dos resíduos, seja pela sua reconhecida omissão na busca de soluções para reduzir os impactos negativos.

 Em síntese, o município é o proprietário dos resíduos uma vez que pagou muito dinheiro para estocá-lo em condições totalmente inadequadas sob o ponto de vista ambiental, colocando em risco os ecossistemas e a saúde humana.

 O descumprimento do prazo legal para desativação dos lixões pode ensejar a aplicação de multas à administração municipal, além do enquadramento do prefeito e demais responsáveis pela administração dos resíduos na lei de crimes ambientais (Lei n.º 9.605/1998).

 Assim, o prefeito e demais responsáveis poderão sofrer penas de detenção e, cumulativamente, ser considerados inelegíveis nas futuras disputas para cargos eletivos.

 Mas a culpa desse estado de coisas não se limita apenas aos prefeitos. A culpa deve ser repartida com as associações de municípios e com as administrações estaduais.

 Entendo que as associações de municípios prestaram um grande desserviço ao país na medida em que se empenharam para ampliar os prazos estabelecidos em lei, sempre sob a alegação da falta de recursos, etc.

Em nenhum momento houve uma mobilização para encontrar soluções mais eficientes ou buscar novas tecnologias.

 Da mesma forma entendo que cabe uma parcela de culpa às administrações estaduais na medida em que pouco fizeram para conscientizar a população e os gestores municipais quanto à gravidade e complexidade do problema.

 Essa postura distante dos Estados denota descompromisso social e colide com a chamada “responsabilidade compartilhada”, outra inovação introduzida pela PNRS, que obriga a todos, sociedade, setor público e as diversas esferas administrativas a trabalhar em conjunto na solução dos problemas associados à gestão dos resíduos sólidos.

 Uma solução razoável seria aglutinar municípios em consórcios públicos com vistas a otimizar a gestão de resíduos, reduzindo custos operacionais e administrativos, além de garantir grandes volumes de resíduos recicláveis que poderiam ser encaminhados às indústrias de reciclagem (com geração de emprego, renda, tributos e qualificação da mão de obra local).

Perdemos um tempo precioso na condução dessa questão e os problemas se acumularam.

Agora resta-nos a esperança de que o Ministério Público e os órgãos de fiscalização adotem medidas legais e administrativas junto aos municípios inadimplentes, objetivando a punição dos responsáveis.

 Se essas medidas coercitivas não forem adotadas teremos dado um enorme passo para que a PNRS se transforme um uma lei que “não pegou”.