Arquivo da categoria: Biotecnologia e Agronegócio

Aquecimento Global e Conflitos Humanos

O aquecimento global e suas consequências em termos de mudanças climáticas constituem um dos temas centrais no debate entre as nações, em especial no que tange aos aspectos político, econômico e ambiental.

O processo de aquecimento global é um fato incontestável e, de acordo com os cientistas de renomados centros internacionais, não será possível obtermos uma redução nos níveis de temperatura nas próximas décadas.

 Esse cenário pessimista está amparado em dois argumentos:

a)     Os países ainda não encontraram um ponto de equilíbrio que contemple a ampla gama de interesses políticos e econômicos existentes, ou seja, ainda não podemos falar de um acordo real e eficaz em escala mundial para redução dos gases do efeito estufa.

As iniciativas anteriores tais como o Protocolo de Kioto ainda enfrentam resistência de países como os EUA, o que dificulta a sua efetiva implantação e a obtenção de resultados mais concretos.

 b)    O processo de aquecimento global possui condições ou “gatilhos” que podem ser disparados a qualquer momento, aprofundando os impactos. Em outras palavras o processo pode ser auto alimentado independentemente de nossas futuras ações ou acordos em nível mundial.

Dentre os impactos mais significativos associados ao processo de aquecimento global podemos destacar:

a)     Mudanças climáticas severas ocasionando secas, inundações e furacões de maior intensidade;

b)    Comprometimento da segurança alimentar em razão das perdas agrícolas significativas, penalizando os países mais pobres da África, Sudeste Asiático, América do Sul, América Central e Caribe[1];

c)     Comprometimento da biodiversidade e da capacidade de resiliência de nossos ecossistemas[2];

d)    Elevação do nível médios dos oceanos;

e)     Perdas de recursos pesqueiros pela acidificação dos oceanos[3].

O somatório desses impactos trará a necessidade de deslocamento de grandes contingentes populacionais em busca de proteção, segurança alimentar e perspectivas de vida.

No que tange à segurança alimentar acredito ser necessário destacar alguns aspectos importantes:

O risco de quebras de safras agrícolas decorre da sinergia entre diversos elementos, tais como:

a)     Redução da área disponível para plantio.

 A disponibilidade física de terras aptas para o plantio deverá diminuir em função da ampliação dos processos de desertificação ou mesmo do alagamento de áreas litorâneas anteriormente usadas na agricultura.

 b)    Redução da adaptabilidade das espécies em razão das mudanças de temperatura, precipitação, umidade, etc.

 As mudanças climáticas podem ser traduzidas em alterações não apenas na temperatura local, mas também em termos da disponibilidade de água para os cultivos.

Muitas cultivares de valor econômico são sensíveis às pequenas alterações nos padrões de temperatura e/ou precipitação, reduzindo ou paralisando seus processos de reprodução, germinação e crescimento vegetativo.

 c)     Surgimento de novas pragas e doenças.

 As alterações climáticas podem propiciar o surgimento de novas pragas, insetos e doenças em áreas onde anteriormente não existiam.

Assim, uma pequena elevação na temperatura média ou uma mudança nos níveis de umidade local podem facilitar a introdução de insetos como vetores de doenças, reduzindo a produtividade.

Da mesma forma haveria maior probabilidade para o surgimento de doenças transmitidas por fungos, vírus, nematoides, bactérias e outros.

 Obviamente o resultado desse quadro caótico é o acirramento dos conflitos humanos, uma vez que teremos um maior contingente populacional disputando recursos limitados (abrigo, alimentação, água, recursos naturais, etc.).

O processo de aquecimento global não atua em uma escala pontual ou limitada, mas, ao contrário, se traduz em intensas e amplas transformações que atingirão todos os países.

Aqueles países mais ricos e detentores de tecnologia de ponta, em especial no que concerne à geração de alimentos e energia, terão maiores possibilidades de se adaptar aos impactos.

Os países mais pobres, que já vivem um quadro de limitações angustiante, sofrerão ainda mais, sobrecarregando nosso sistema financeiro.

Há uma clara tendência a vivermos em um mundo não apenas mais quente, mas faminto.

O que fazer?

Acredito que em um primeiro momento devemos nos mobilizar para limitar o aquecimento global, postergando os seus impactos.  Essa meta pode ser alcançada com a adoção de estratégias globais associadas à:

a)     Pesquisa para desenvolvimento de novas fontes alternativas (limpas) de energia, substituindo gradualmente os combustíveis fósseis;

b)    Redução dos níveis de consumo;

c)     Identificação das áreas mais vulneráveis em termos globais, definindo as ações a serem tomadas para minimizar os impactos;

d)    Investimento maciço em pesquisa agrícola para desenvolvimento de espécies mais resistentes às mudanças climáticas (ex.: seca, solos mais pobres, presença de maior variedade de insetos nocivos, etc.).

  CONCLUSÃO

As mudanças climáticas estão associadas ao aquecimento global, um processo tido como irreversível em curto prazo, o que implica na necessidade urgente de adotarmos políticas eficazes de proteção.

O breve resumo dos impactos que poderão advir do aquecimento global permite verificar que nossa agricultura será fortemente afetada, com grande repercussão econômica e social.

Muitas de nossas áreas produtivas serão suprimidas, quer pela seca intensificada ou pela elevação de alguns centímetros no nível dos oceanos, e não há certeza quanto à possibilidade de que sejam substituídas por novas áreas alternativas.

A exploração de novas áreas para garantir a produção de alimentos nos obriga a uma grande inversão de recursos financeiros vinculados à complexa infraestrutura em termos de oferta de energia, estradas, silos, etc.

 Uma excelente linha de atuação seria o investimento em biotecnologia com vistas a desenvolver novas cultivares com maior resistência à elevação de temperatura e alterações em termos de umidade, ação de insetos, etc.

 No caso brasileiro caberia ao Governo Federal intensificar o apoio à EMBRAPA, uma instituição de excelência reconhecida mundialmente pelos avanços alcançados na pesquisa agrícola.

            marceloquintiere@gmail.com


[1]  A esse respeito sugiro verificar nosso artigo intitulado “Aquecimento Global: Mais Insetos e Doenças”, publicado em 8/1/2013 no Blogdoquintiere.

[2] A esse respeito sugiro verificar nosso artigo intitulado “Biodiversidade e Resiliência”, publicado em 9/2/2013 no Blogdoquintiere.

[3] A esse respeito sugiro verificar nosso artigo intitulado “Oceanos Ameaçados” e “Oceanos e Riscos Ambientais”, publicados, respectivamente em 29/10/2012 e 1/11/2012 no Blogdoquintiere.

O Mundo sem Vacas?

Na semana passada uma notícia do mundo tecnológico circulou pela mídia com grande impacto: cientistas desenvolveram carne artificial a partir de células – tronco.

O grupo da Universidade de Maastricht na Holanda desenvolveu o hambúrguer ao longo de cinco anos usando células do músculo do pescoço de duas vacas. – um projeto que custou quase 250 mil euros (R$ 762,5 mil).

As células foram colocadas numa solução de nutrientes para se transformar em tecido muscular que, em seguida, deu origem a pequenos filamentos de carne.

Eventualmente a produção de carne em laboratório poderá ajudar a alimentar o mundo e a combater as mudanças climáticas ao longo das próximas décadas.

O link entre a pecuária e o aquecimento global está associado à produção de metano durante o processo de digestão do rebanho bovino.

A cada dia os milhões de animais criados nas fazendas de todo o mundo lançam na atmosfera o metano (CH4), um gás do efeito estufa com um potencial muito mais nocivo do que o gás carbônico (CO²) e que contribui fortemente para o aquecimento global.

Os futurólogos já visualizam um futuro próximo onde as enormes fazendas de gado serão substituídas por fábricas de proteína sintética, com vantagens sociais, econômicas e ambientais bastante significativas.

Sob o ponto de vista social teríamos a utilização das áreas destinadas à pecuária (milhões de hectares em todo o mundo) destinadas à agricultura básica voltada à produção de alimentos tais como grãos, frutas, hortaliças, etc.

A agricultura é reconhecidamente mais intensiva em tecnologia e mão de obra do que a pecuária (ainda mais se considerarmos o aspecto extensivo da pecuária em muitos países), possibilitando a inserção de maior número de trabalhadores no mercado.

Além disso, a carne produzida in vitro teria maior condições de controle e oferecer melhor qualidade sanitária, eliminando o risco de disseminação de doenças graves como a “vaca louca”, aftosa, teníase, brucelose, tuberculose, etc.

A questão econômica também merece considerações na medida em que haverá uma profunda modificação na cadeia produtiva da carne .
De forma resumida não teríamos que adquirir enormes áreas para implantação das fazendas de gado, eliminando diversas atividades tais como:

• Derrubada de florestas nativas;
• Operações destinadas ao plantio da pastagem (destoca, aração, adubação, gradeação e plantio);
• Colocação de quilômetros de cercas;
• Produção de sementes de gramíneas cujas variedades sejam mais adequadas às diversas condições climáticas;
• Adubação periódica e tratos culturais para manutenção da qualidade dos pastos (aplicação de grandes quantidades de agrotóxicos, etc.);
• Rotação de pastos;
• Necessidade de construção de silos para estocar as gramíneas naqueles países com inverno mais rigoroso;
• Transporte do gado para abate;
• Construção dos abatedouros e frigoríficos; etc.

Quanto ao enfoque ambiental as mudanças previstas são tremendamente impactantes e podem auxiliar na melhoria das condições de vida do planeta, em especial se considerarmos os seguintes aspectos:

• Menores emissões de metano à atmosfera, reduzindo o seu reflexo sobre o aquecimento global;
• Redução no uso de agrotóxicos;
• Diminuição da contaminação de solo e água;
• Manutenção da vegetação nativa nas áreas que seriam alcançadas pela expansão da pecuária nas zonas de fronteira;
• Proteção às florestas e redução no ritmo de degradação da biodiversidade; etc.

Evidentemente não se imagina a extinção total de nossos rebanhos, uma vez que outras indústrias, tais como os curtumes , também são dependentes da pecuária.

Penso que o uso da tecnologia de ponta poderá nos trazer o grande benefício de PENSAR sobre as nossas opções de produção em ternos sociais, econômicos e ambientais, inserindo novos parâmetros de análise.

Será que precisamos realmente de áreas tão amplas para a atividade pecuária?

A expansão da atividade pecuária em zonas de fronteira é viável e recomendada, mesmo sob o forte risco ambiental que representa (eliminação de florestas nativas e degradação da biodiversidade)?

A terra não deveria ser utilizada de forma mais racional e rentável, inclusive sob o aspecto de fornecer oportunidades para todos?

Enfim: vejo com bons olhos o surgimento de novas linhas de pesquisa e considero que a melhor solução para nossos problemas ambientais passa pela racionalização de nossas atividades econômicas.

Para finalizar informo aos amantes do churrasco tradicional que a nova tecnologia ainda precisa superar problemas técnicos importantes na medida em que a carne produzida in vitro é branca pela ausência de sangue.

BIOTECNOLOGIA e AGRONEGÓCIO

                Ainda sob os efeitos da conferência Rio+20 procurarei desenvolver uma análise acerca da interação existente entre o agronegócio e a pesquisa em biotecnologia, segmentos que a meu juízo possuem ampla complementaridade.

                De acordo com dados do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), a expansão do agronegócio até 2030 vai necessitar de 5,5 milhões de hectares de novas áreas e esse processo de expansão ocorreria quase que integralmente na área de Cerrado.

                Não desejo discutir os números do desmatamento no Brasil ou a ampliação de nossa fronteira agrícola motivada pela necessidade de garantirmos superávits na balança comercial.

                Todos sabem que o desmatamento, apesar das reduções comemoradas recentemente pelo Governo Federal, ainda ocorre em níveis significativos e compromete a biodiversidade e a qualidade dos solos.

                A dinâmica da exploração agrícola no Brasil impõe, em muitos casos, uma lógica perversa na qual a terra é adquirida a preços relativamente baixos (se comparados à realidade internacional), seguindo-se das etapas de:

  1. Desmatamento com a venda de madeiras nobres e produção de carvão vegetal com forte impacto sobre a biodiversidade;
  2. Abertura de pastos que pouco contribuem para a proteção dos solos contra processos erosivos;
  3. Exploração comercial de projetos agropecuários que, em geral, são conduzidos de forma extensiva ocupando amplas áreas e proporcionando baixa produtividade;
  4. Queda da fertilidade do solo ao longo do período de exploração por falta de investimentos e tecnologia apropriada;
  5. Abandono das áreas degradadas.

           Embora o agronegócio seja imprescindível ao desenvolvimento nacional, inclusive no que concerne à geração de empregos, rendas e tributos, entendo que há uma ampla margem para o seu aperfeiçoamento.

           O aperfeiçoamento do agronegócio passa pelo desenvolvimento de pesquisa tecnológica para aumento de produtividade e pela recuperação das áreas atualmente degradadas.

           Penso que seria imprescindível extrair maior retorno econômico de cada hectare explorado, minimizando os impactos do agronegócio sobre o meio ambiente e a pressão que vem sendo exercida para abertura de novas áreas, em especial na região dos Cerrados.

          Nesse contexto vemos a pesquisa em biotecnologia como uma alternativa racional para garantir, a um só tempo, a proteção dos ecossistemas e a ampliação das margens de retorno do agronegócio.

          A biotecnologia poderia gerar melhoramento genético com o desenvolvimento de novas variedades ou cultivares mais resistentes e produtivas, novos produtos tais como fármacos, resinas, corantes, alimentos, fibras, etc.

          O Brasil possui uma ampla rede de Unidades de Conservação que, somadas às unidades de uso sustentável, somam mais de 160 milhões de hectares, representando aproximadamente 20% de nosso território.

           Essas áreas, criadas e protegidas por lei, representam uma significativa vantagem competitiva do Brasil em termos de potencial para novas descobertas e ampliação do conhecimento científico.

           À primeira vista viveríamos no melhor dos mundos: grandes extensões de terra, clima propício, mão de obra, pesquisa agrícola, empresas de grande porte associadas ao agronegócio e imenso potencial para pesquisa em biotecnologia.

          Acredito que nenhum outro país deve contar com um conjunto tão favorável de parâmetros.

          Mas o problema reside exatamente no uso ou percepção que temos acerca das nossas potencialidades.

          Enquanto o agronegócio apresenta forte expansão ao longo das últimas décadas, a pesquisa em biotecnologia ainda carece de recursos para capacitação de cientistas, desenvolvimento de linhas de pesquisa, implantação dos necessários laboratórios de ponta e de um marco legal que possa alavancar a atividade.

           O agronegócio é dinâmico e agressivo ao passo que a pesquisa biotecnológica ainda é lenta.

           Pesquisa e agronegócio são duas faces de uma mesma moeda e não há lógica em incentivar um segmento em detrimento do outro. Acredito que ambos, agronegócio e pesquisa, deveriam buscar maior sinergia ampliando uma parceria notória em outros países ricos.

          Caso não ocorra um esforço concreto em favor da pesquisa de ponta nesse país nosso agronegócio estará condenado ao marasmo e decadência a médio prazo.

          Não há um só país rico cujo processo de desenvolvimento tenha ocorrido de forma dissociada da pesquisa.

          A pesquisa é o motor do desenvolvimento de um país. Vejam os exemplos dos EUA, Japão, China, Coreia do Sul e Alemanha…

         Não se pode pensar em desenvolvimento econômico e social, ou mesmo no tão decantado Desenvolvimento Sustentável, sem uma política objetiva que garanta investimentos maciços e consistentes em pesquisa.

         O MMA vem desenvolvendo esforços no sentido de criar um novo marco legal para a bioprospecção no país que, segundo declaração do Secretário de Biodiversidade e Florestas daquele ministério, deverá ser transformado em projeto de lei até o final deste ano.

          É uma ótima notícia. Afinal, o Brasil precisa adotar uma política consistente e agressiva para garantir a implantação de indústrias de ponta em biotecnologia.

          O investimento em biotecnologia costuma gerar bons resultados: o desenvolvimento de um novo remédio pode garantir receitas de bilhões de dólares sem que seja necessário comprometer nossos ecossistemas.

          Em outras palavras a pesquisa em biotecnologia pode ser útil para atribuir valor econômico à “floresta em pé”: ao invés de perpetuamos o ciclo perverso de destruição ambiental poderemos garantir maior retorno econômico e social sem degradação.

         Uma proposta para incentivar a pesquisa de ponta em biotecnologia seria a criação de um fundo nacional no qual todos, empresas e cidadãos, poderiam alocar recursos financeiros de forma livre.

         Os recursos seriam alocados exclusivamente na formação de cientistas altamente capacitados, construção de laboratórios com tecnologia de ponta, aquisição de equipamentos mais modernos e sofisticados, etc.

         Obviamente os resultados não surgirão em curto prazo.

         A pesquisa é assim mesmo: exige tempo, dinheiro e planejamento.

         Em muitos casos a linha de pesquisa não resultará em ganhos econômicos, apenas fomentará o conhecimento acadêmico de centenas de cientistas. Em outros casos o retorno será muito lento.

          Entretanto, ao final de alguns anos, poderíamos contar com novas descobertas (cura do câncer, da Aids, do diabetes, do Mal de Parkinson, do Mal de Alzheimer, etc.) cujo reflexo humanitário e econômico superariam largamente aqueles obtidos pela exploração ineficaz de nossas florestas.

         O retorno para os investidores se daria através da participação nos resultados econômicos obtidos pelas empresas de tecnologia.

         Parece um bom começo.

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